sábado, 29 de novembro de 2014

Porra e outra vez Porra

E outra vez...

Caramba, sinto a raiva não conseguir conter, mas ainda assim quero-a manter, para algo sentir. Sem ela apenas o vazio me resta. Vazio esse que tanto esforço custou em preencher.
 
Preenchimentos feitos de ilusões e sentimentos a espaços, sem materialidades distantes da dimensão física e temporal, para além dos momentos. Para mim momentos mas tudo significando dentro dessa dimensão.
 
Desequilíbrio absurdo, pautado por uma tontura sentimental que impossibilita qualquer discernimento de lógica, ou perceção de preenchimento.
 
Preenchido ou vazio, ilusório ou real, que importa se este ardor me destrói num desagrado de incompreensão.
 
Assassino de sentimentos, cuja vítima julgaria ser apenas eu, mas que provoca genocídio das personagens que tomam forma nos momentos.
 
Porra mas que porra... 

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Medo

Ancestral sofridão e demonstração de fragilidade animal. Medo de tanto, medo de nada, medo de sentir, medo de viver. Porque terá surgido? Como surgiu?

 
Dor, ódio, falta de amor, repúdio, sofrimento, angústia, desilusão, perda, solidão, choro, fragilidade... Tudo pedras arremessadas à fundação do individuo ameaçando-o fazer ruir, numa devassidão que suprime todo o desejo, toda a cor, toda a coragem.
 
 
Tão pouco é preciso fazer para afastar o medo, mas tanto mais o faz regressar. Desequilíbrio de ações que se traduz num absurdo duelo entre o passo em frente e a rendição figurativa à posição fetal.
 
 
Rosto que te toldas perante o medo
É de um abraço que precisas?
Um beijo talvez, ou nada quem sabe
Ofereça o pobre aquilo que não tem
Porque gozas tu coragem o medo?
Tu que estás só, ele que tem tanta companhia
Eu, tu, ele, nós, vós, eles - todos
Todos temos medo de algo, medo de ter medo
É isso o medo - somos nós!


In Letras do Olhar 06 de Junho 2014

domingo, 12 de outubro de 2014

De volta ao refúgio

O ser humano nasce e perante ele se prostra um mundo de possibilidades, de infinitas descobertas. Cresce a aprender, a conhecer, a explorar, desenhando o seu mapa e traçando novas fronteiras. De início usa todos os seus sentidos; os olhos para saber o que pretende alcançar, seduzido por cores, movimentos e formas; os ouvidos para entender entre o indecifrável desejo dos progenitores em comunicar, se se tratam de estímulos para prosseguir ou de alerta; os rudimentos da fala que exteriorizam mais de que vocábulos, mas sons de pura orgânica, anunciando a sua presença; o tato e o nariz, ainda presentes pela boca, pois a criança tudo cheira, tudo toca, levando simplesmente à boca.
 
 
O desejo de refúgio, de segurança é superado pelo desejo da aventura,  da descoberta, do alargar de horizontes. O conforto, a comodidade, a segurança do refúgio está lá, bem presente, sempre de braços abertos.
 
 
Cresce o ser humano e a cada descoberta, a cada traço no mapa exponencia-se a sensação de vazio. Desvanece-se o entusiasmo, surgem as dúvidas... A teimosia de não desistir sempre empurrando em frente, trás a dada altura a consciência da dimensão ridícula que cada um na verdade tem. Escala de tempo e espaço de dimensão reduzida, na vastidão do que há ainda por descobrir.
 
 
Os ouvidos nada parecem escutar, a boca fala da mente em línguas que ninguém parece compreender, o cheiro captado é irreconhecível, os olhos fecham-se pois não querem olhar para lado algum, como que impedindo assim a progressão. As mãos essas, as mais insanas, abrem-se em toda a amplitude, num gesto de generosidade e no rosto procuram tapar boca, olhos, ouvidos e nariz...
 
 
Num rasgo de coragem, olhando em redor procura-se o conforto. Sim ele, onde está? Em mares tenebrosos procura o farol que te encha de calor, de energia, de esperança. Segue-o, ele consegue trazer-te de volta, de regresso ao refúgio...
 
 
Encontrar o equilíbrio entre o conforto e a descoberta é a chave do indomável espírito humano. Os que do conforto prescindem, nada farão com a descoberta. Quem não se liberta do conforto, já mais descobrirá o seu lugar e o sem tempo, embora porém possivelmente mais felizes pois a sua dimensão é a que escolhem ter.
 
 
Sai, aventura-te, descobre, arrisca, vive e sente! Encontra o teu farol, mantenho-o sempre presente, mesmo que te surja pelo canto do olho como uma imagem desvanecida e desfocada. Assim que a dor, o cansaço, a saudade, a tristeza surgirem, vais querer voltar ao refúgio!
 
In Letras do Olhar em 17 de Maio 2014

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Sílabas

Palavra que define o meu estado - sílabas. Palavra que nem o chega a ser, não é mas chama-se. A palavra tem três, e elas as sílabas têm uma. O que contem o quê e quem define quem?
 
Assim sou eu, uma intenção, somatório de despropósitos, definindo-me em fórmulas sem exatidão. Queria ser apenas a sílaba porque gosto, porque soa bem, porque ninguém a define, porque não é nada e traz a liberdade de tudo. Liberdade de imaginar, liberdade de completar, liberdade de recriar. Não quero existir nas fronteiras delineadas da palavra, preciso mais espaço, preciso mais liberdade.
 
Sílabas, que bem me soam, como delas gosto. Sílabas repito uma e outra vez, repito todas as vezes que necessito menos uma, por mais que some um ao infinito. Mas escuto-me e acalmo-me, expando-me, relaxo e abstenho-me da melancolia que se apodera. A melancolia que sempre desejo, mas que a saudade não sinto, quanto por perto não a tenho presente.
 
Entre palavras que mais não são que sílabas traço rudimentos do que apoquenta o âmago e liberto-me no poder que me reencontra caprichosamente...

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Aqui e agora

E aqui estou eu. Aqui neste momento e agora neste sítio.
 
Tanto tempo volvido surjo, sem qualquer estranheza pois a sincronia das sensações espelhadas na rotina a que me obrigo, assim o dita. O tempo é agora e o despertador toca. A dormência de risos sem conteúdo, alegria sem motivo, descontração e euforia apenas ameaçada por uma sensação de estranheza, como brisa fria num dia de calor.
 
Tinha de ser, sinto-me eu, agora e aqui, sim eu... Porra de melancolia porque tardas-te, agora não me sinto tão só. Já não rio, já não me encho de euforia mas encontro-me preenchido com tanto vazio.
 
 
Do you know when you feel overwhelmed with something and simply someone whisper close to you ear?! So, it's really me: the best pessimist walking with happiness.

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Um dia, criança, um dia!

Alheio a tudo, pequeno ser com todo o significado da existência. Retratos esborratados de figurantes que mais não são que isso. Deslumbres de atividades, aparentemente longínquas.

Captura de desejo por concretizar ou, imagem indistinta do passado, tanto faz. Lentamente o foco surge sobre a criança e tudo em redor se desvanece na importância inexistente. Fosse o mundo assim, fossem os problemas e as soluções passíveis de serem trabalhadas com um brinquedo.
 
Felicidade contida em tão pouco. Simplicidade e harmonia tranquila. Nada aflige, nada preocupa, nada distrai. É uma criança, é a pureza, é a ingenuidade. Resumindo é tudo o que o que se esbate e desaparece, não o sendo.
 
O beijo quente do sol, a frescura da água, o aconchego do chapéu, a textura da areia, o silêncio do ruído distante... Fascinante imagem que suscita dos mais primários instintos de progenitores, nos desígnios do saber ter perdido, o que sempre deveria existir.
 
Palavras cruas, frias, aparentemente desprovidas de calor emotivo, num render incondicional ao que por esta foto foi roubado. Velhas crenças, significados recentes, roubo o houve, não da alma da criança, mas do espírito de quem pelo retrato a observa.
 
 
In Letras do Olhar, 08 de Maio 2014

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Por um caminho diferente

O percurso na vida: ponto de partida, local de chegada, nascimento, morte. Algo liga estes dois pontos, reta essa que poderá ser chamada de percurso.

A geometria da vida não segue contudo a matemática e a racionalidade dos números. A reta toma diversas direções, sentidos opostos, numa insanidade à qual não se encontra Criador para tal.
 
Destino, aflora à ideia desta conceção, mas não, seria demasiado redutor, simplista por assim dizer. Ponto de partida, ponto de chegada, unidos por um percurso, que toma diversos caminhos. Nesta simplicidade reside o início desta ideia...
 
Caminho ladeado por árvores, há muito pouco tempo desprovidas de vida, de folhas, de cor. Os pássaros exibem-se numa profusão de sons; os ramos esgalham-se, assediados pela mesma brisa que acaricia a pele despida e suada do caminhante; pelo nariz invadem promessas de esplendor odorífero.
 
Inquietante escolher um caminho, o caminho. Horrendo por vezes seguir nesse mesmo caminho. Por vezes o caminho é muito largo e muitos seguem a par do caminhante, outras porém seguirá sozinho mais tempo que o deseja, pois os obstáculos terão de ser vencidos na individualidade.
 
Por vezes, as árvores estão totalmente despidas, chove e está frio; outras vezes está calor, e na sombra das árvores encontra-se resposta à súplica para refrescar; por vezes o caminho está tal qual aqui se mostra; outras vezes é sugada a energia das folhas, até que se debruçam num último mergulho sobre o chão, ostentando cores intensas e acariciando os passos do caminhante...
 
Sazonalidades, simples caprichos do destino. Destino insiste em surgir, mas aqui não toma lugar. Se ao menos os caminhos tivessem setas amarelas indicando qual a escolha, com a sensatez de fazer parte do percurso!
 
Escolhe sentir, escolhe descobrir, escolhe confiar nos sentidos, escolhe seres tu. Escolhe saber escolher, com consciência de onde vens mas sem te importares para onde vais e qual o fim. Saberás ser o teu destino quando souberes afirmar: estou aqui e estou vivo!
 
Se ainda não o sabes dizer então segue por um caminho diferente...
 
In Letras do Olhar em 04 de Maio

terça-feira, 12 de agosto de 2014

Pensamento a descoberto


Na solidão o silêncio dos pensamentos torna-se um ruído ensurdecedor!!!

domingo, 10 de agosto de 2014

O Anjo

Anjo caído ou humano erguido... Indícios celestiais pautados em rudes traços humanos!

Para quê artificialidades? O porquê dos ornamentos, qual a causa das imaterialidades físicas tornadas visíveis?
 
As sombras que ornamentam as janelas; janelas essas que deveriam confiar a visão da alma divinal.No entanto precipitam num abismo de sufoco.
 
Mas e as asas? Asas de anjo amarrados a um corpo humano. Divindade mundana! Incoerências numa mitologia inexistente nos tempos modernos.
 
"Abraça-me, toma-me, limpa a sombra dos olhos que escurece a minha alma, com as lágrimas que derramo..." Parece dizer sem mover boca ou olhos!
 
A boca... Não se beija um anjo!
O peito... Maternidade humana.
As asas... Voos de imaginação!
Os ombros... Abraços bem reais.
 
Um anjo sem dúvidas, pois pudera algum descendente do útero de Eva, assim se erguer. Todavia um anjo caído, anjo que se abraça, anjo que se ergue. Basta acreditar, basta encontrar, basta erguer.
 
Tomar nos braços para erguer à condição humana, para que depois as asas elevem onde os sonhos persistem, sem que nenhum dos dois alguma vez caia.
 
In Letras do Olhar 29/04/2014

quinta-feira, 31 de julho de 2014

Dançar nas nuvens

"Se te aproximares eu salto!" Assim parece ela dizer, num simples retrato encaixotado na moldura de uma janela, tendo por cenário um céu pincelado a cores de nuvens.

Gingar de anca, abraçado no encarnado do que está por despir. Roupas não têm lugar na dança das nuvens.
 
Pé ante pé, uma mão segurando o abismo, a outra balbuciando convite para aproximar. Desafio, ou ameaça? Aproximar, ou seguir sentido oposto?
 
Encantamento do olhar, focado num rosto que se resguarda, onde o cabelo reforça a forma do mistério.
 
"Tens de largar a mão!" Eis o que anseia ouvir, quando o tempo sente, o espaço deseja e a solidão se apodera. Solidão, essa forma monstruosa da miséria humana.
 
Não é de solidão que se trata, não aquela que se define pelo oposto à presença próxima de alguém ou algo. Serenidade rítmica, apelativa ao olhar num salto de fé, onde o abismo é vencido pela força magnetizante do horizonte, oferecido pela mais pura das danças.
 
Bailarina que fazes dançar, ninfa dos tempos modernos... já és vista, já és sentida; os sentidos despertam, a mão é agora agarrada, a outra liberta-se para fechar a janela.
 
Que a dança se inicie, com a sofreguidão da primeira golfada de respiração após um longo coma. Nas nuvens se sentem - nas núvens- pois no solo não há essa possibilidade!
 
Na janela que tudo mostra, apenas tu és vista!


In Letras do Olhar em 25/04/2014

domingo, 20 de julho de 2014

Distâncias perpétuas

Duas árvores e um banco, uma distância e dois seres vivos.
Imóveis, estáticos, cheios de vida, com desejo de florescer numa altivez de clorofila.
Distância guardada por um objeto antrogênico, com resquícios de materialidades, ora vivas que o foram apenas em memórias de experiências passadas.
Porém braços tocam-se, embalando as folhas com a suavidade, desculpa da brisa que sussurra cumplicidades partilhadas. O banco esse trás o conforto, não sem distanciar na vergonha da preguiça de passados defuntos.
A distância é o convite à pausa, ao conforto, à contemplação. Para lá da colina ergue-se uma superfície de oportunidades, cujos braços tão juntos que as mãos se dão, conseguem antever um movimento de perpétua inércia. Não se movem mas poderiam-o fazer; ramos que são braços, braços que são asas, e o prado verde transforma-se num céu azul prestes a ser rasgado pela energia inebriante de dois seres vivos ora árvore, ora distantes.
A primavera e a vitalidade, folhas e mais folhas. Desvanece-se a distância, desaparece o banco entre toque de braços que se funde num abraço. Não há conforto, não tem de o haver, mas o banco, a distância, essa persiste e está presente.
Os outros momentos sazonais são amenos em termos de proximidades. Os outros, pois falta mencionar inverno. Parte o fulgor, esvai-se a energia, sucumbe a cor, prevalecendo apenas a forma do banco. Materialização de distâncias.
Asas, braços, ramos, ser vivo... Dois uno, simplesmente regredindo em dois indivíduos. Brisa é substituída por feroz vendo que suga os últimos resquícios de energia em forma de folhas de tons envelhecidos, provocando agressivos estocadas entre ramos.
Só o banco não muda, apenas a distância não se altera. Ciclos intermináveis, que não cessam à escala temporal de duas existências. Traço de escrita cinzento, pois os seres vivos retratados não só terão braços no lugar de ramos, como pernas no lugar de raízes num antropomorfismo ímpar.
Porque terá o "jardineiro" as plantado tão longe e porquê o banco?

In Letras do Olhar 22/04/2014

segunda-feira, 14 de julho de 2014

Despertar do olhar

Momento que desconhece fronteiras físicas ou temporais. Reveste-se de significados que se perdem até onde a raça humana se atreveu a povoar, numa escala de tempo apenas mensurável na tradição oral.

Fusão de significados, de sentidos, de uniões indisfarçavelmente absurdas. Luz e penumbra, início e fim, noite e dia, apenas a parte do tudo que é representado, cativando para além da compreensão.

Sem lágrimas, sem risos, sem palavras, sem gestos... Imobilidades físicas, abraçando um momento solene de indiscutível profundidade.

O dia morreu, a noite nasce. Fecha os olhos a luz, arrefece o calor, o nosso corpo acompanha estes estímulos que nos circundam, abrandando e entregando-nos a uma sonolência que se apodera de nós. Sentimos chegar uma morte sem luta, sentimos aproximar-se o desejo de recolhermos e dormirmos. Mais um fim, mais uma morte, a morte do dia, o sono, o adiar da vida numa pausa obrigatória.

Observar o por do sol é um ato de solidão, um ato de egoísmo. Sentirá o pescador ser apenas dele este momento, quando se julga só? Milhões destes momentos, multiplicados por todos os locais, porque não possuir este, negando mesmo a quem o captura pela lente? A sua dimensão dissolve-se tal qual a sua silhueta perante a incapacidade de focar; jaula alguma pode conter este momento, pelo que o que vem e vai independentemente da vontade e do desejo, alguma vez pode ser propriedade de alguém.

A cor que explode como gastando as últimas réstias de energia, antes da lâmpada se fundir e a escuridão tomar o seu lugar devido. O Sol desaparece com fulgor para regressar timidamente, enquanto que a Lua goza de mais maturidade e aguarda pacientemente a sua vez de chegar e partir. Não há nascer, ou por da Lua, não há, ela apenas existe.

Outras histórias, outros fulgores, dispersares de ideias e sentimentos. Arrebatamentos, memórias, sensações que perduram e estimulam. Entre recordações e estímulos, sejamos exacerbados pelo poder paralisante do por de sol mais marcante que tenhamos presenciado, finalizando momentos que têm de terminar, com a promessa de um novo começo nos encha de uma nova esperança.

Assim se julgue o pescador seu proprietário, despertando pela penumbra!

In Letras do Olhar 20/04/2014

domingo, 6 de julho de 2014

Desencontro

Como podem Sol e Lua apaixonarem-se? Como pode amor acontecer se os dois não se juntam? O Sol sempre procurando e mesmo sabendo onde ela está, chegando não a encontra. Será que se esconde?

Terá de ser a Lua, só ela o pode encontrar! Tímida e apaga, por vezes se faz notar, mas o Sol não a reconheço pois não é ela.

Fácil fechar olhos e desejar, sentir ainda que apenas com palavras. O sentir que se descreve mas que não toma a dimensão para além dos traços desenhados pela linguagem humana, quando tudo surgiu antes.

O Sol nasceu para ser cometa e não estrela. Deslocar-se em tempos e em espaços diferentes, e não desta forma...

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Escalar o Mundo

Pedra ante pedra se ergue o pedestal. Pedestal este destituído da cor, abraçado pelo cinzento, buscando o beijo do azul.

O mundo aos pés, escalado pela força dos braços. A mente essa, perscruta o horizonte, olhar descaído no receio das alturas e a respiração ofegante beijando o ar que penetra as narinas, sufocando o pânico que ameaça apoderar-se.
 
O poder da grandeza rapidamente sucumbe ao desespero avassalador da solidão. Solidão essa que abraça por todos os lados, sem mostrar rosto, sem aquecer com o toque, mas sussurrando ao ouvido o silêncio que gela a mente e estremece o âmago mais íntimo.
 
A escalada iludiu com a sobranceria sobre o mundo abaixo prostrado. O mundo deixa-se escalar apenas para mostrar o devido lugar das coisas. Ele lá em cima entende agora o seu lugar e vendo-se não mais que uma coisa, pé ante pé, precipita-se no salto que lhe trará o fim da solidão.
 
Ao menos os pés não fossem pedras...

 
In Letras do Olhar 21/03/2014

domingo, 29 de junho de 2014

Estranho dia

E que bom dia este para escrever. Que mais poderei fazer dele?! Tudo despropósitos que impedem de sentir algo para além disto. O isto que está aqui enraízado, que me tolda a imagem, distorce o sabor, adormece o tato, apaga o odor e atenua o som.

Sátira sem humor, sem astúcia, sem nada. Desprovimentos de intenções, pautados aqui e ali por impressões de sentidos, que mais não são do que miragens sem dimensões, sem vida, sem consciência.

E por isso escrevo e escrevo como se vivesse, mas viverei eu de facto?! Dou-me conta da pequenez, quando todavia não desejo transcender a minha dimensão. Podem parecer confinadas as fronteiras que me delimitam, mas nelas me perco, nelas procuro uma existência que é a minha, mas absurdamente não encontro.
 
Que mais dizer?! Mais não escrevo, pois hoje o dia não é de sentir, viver não é o dia e a escrita é falsa!

domingo, 22 de junho de 2014

Fluir de intencionalidade

A noite cai mas o rio não pára de correr
A noite cai e todos adormecem.
O sol põe-se e outros ganham vida
O sol põe-se e o rio procura o mar.

Parece existir um espaço e um tempo
Tudo com o significado da procura sem busca.
No propósito da existência e da temporalidade
Só eu não encontro onde existir.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Vazio

Procuro encher com significado um conceito totalmente desprovido de tal. Sinto-o, sinto-o avassaladoramente. O vazio enche-me o meu âmago, em mais uma ambiguidade deliciosa.
 
Roubo a ideia, perscruto o significado do sentimento. Saque que mais não é que pedir uma indicação para um caminho, para um destino que ninguém sabe existir, ou como chegar. Ouso sentir, ouso aproximar-me demasiado e demasiado é uma dor que não se sente, mas se mostra.
 
Mostro o despropósito, mostro o oposto. Contradições ou uma vez mais ambiguidades. Agora as minhas, apenas as minhas. A ousadia é de longe superado pelo receio. Receio do desconhecido familiar.
 
Pelo vazio encerro-me sobre mim, cobrindo-me com os meus braços num abraço apertado. Acariciando as lágrimas antes que se formem. Disfarçando medo com sorrisos, nervosismo com parvoíce.
 
Caramba que sufoco, que agonia...

domingo, 1 de junho de 2014

Totalmente absorto por este vazio sufocante.
A solidão esmaga figurativamente o tórax impedindo de respirar.
Solicitude do espírito de agonizante amargura.
E tudo isto para quê?
Surja uma luz, réstia que seja
Ilumine algo, ilumine-me
Resta-me olhar, observar
Do alto, do lado de dentro
Seguro pelas grades que impedem
Não que entrem, mas que eu saia!

domingo, 25 de maio de 2014

Convite endereçado

Tanto se perde nas reticências... A necessidade, o desejo e a rendição somam-se em suspiros na viagem a que sou transportado.

Queria saber render-me, desejar e sentir necessidade de estar contigo a qualquer hora, em qualquer lugar. Contigo apenas contigo!!!

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Saldo de comunicação

Dois telemóveis duas vias abertas, sem qualquer controlo de indivíduos que irrompem quando, como e onde desejam. Um pessoal, outro profissional, um sem saldo, outro com saldo inesgotável. Estranha incoerência perante o desejo de viver outras realidades.
 
Palavras simples, mas como raio encontrar palavras simples para pensamentos, sentimentos, essências não tangíveis. Não disse ser uma pergunta, mas não sei ter sido uma afirmação, simplesmente o é, existe e a palavra é de patética simplicidade.
 
Existir entre dois planos, o que somos e o que desejamos ser. Entre a realidade e a expectativa. "Não é pessoal e não estou a questionar o empenho e o ensejo por realizar tal tarefa..." Meto-me nojo, nesta prostituição não de princípios, não de ideias, não de convições, mas de nada. Nada, mesmo nada e a verdade ""esgotas-me, cansas-me, fazes sobressair em mim os monstros escondidos, não te quero ver"". Duplas aspas para uma citação não dita no passado, desejada neste presente e certamente sem futuro. E ele foi-se...
 
Foi este mas tantos há por ir, pois o monstro tem de ser acorrentado, silenciado, anulado...
 
Não ligo porque não posso de outro modo teria-o feito. Não requer citação, não requer aspas, não requer nada. Estou sem saldo, não posso comunicar. O monstro está pacífico, acordará pelo ruído crescente em meu redor. Palavras, frases, com e sem sentido. Escuto e escuto e escuto. Tento falar, tento... É pessoal, não comunico, não sinto o meu empenho já desisti!
 
Procuro sim, o quê não sei. Passo a vida à procura sem saber o que me falta! Alguém me ouve?!

domingo, 11 de maio de 2014

Toque de Midas

Tudo, tudo o que toco! Estranho dom, estranho talento. Não o pedi, quanto mais desejei.
 
Enquanto calcorrilho os recantos do meu eu interior, buscando respostas para esta inquietude, prostro o olhar perante o recanto das promessas. Duas obras, dois livros, juntos entre várias dezenas, num qualquer questionável capricho dos acontecimentos aleatórios. Um intitulando-se "Ser feliz", o outro "Sinto muito!"
 
Posso eu ser feliz, se apenas deveria desculpar-me, lamentar e rogar pois não o desejei, não o pedi, nem sequer o quis. Mas tendo-o queria trazer algo, transformar algo, algo precioso...
 
Há transformação, há brilho, há mudança, há algo. Talvez tenha de facto alguma sombra talento, talvez seja um dom. No entanto não me alimenta, não me preenche, não me faz feliz. E, e não sei reverter, e choro, encolho-me afasto-me, isolo-me!
 
Mas preciso alimentar-me, preciso preencher este vazio, preciso de acender uma réstia que seja de felicidade. Preciso, o que não posso precisar, não posso, devia saber melhor. Sinto Muito!
 
Queira algo ou alguém, num qualquer tempo que me possa tocar e curar, ou então padecer porque aí se feliz não me sentir então nada sentirei. E aí...
 
E aí... Quando a minha vez de ser enterrado chegar, fiquem as orelhas de fora para que a estória se saiba. As ideias desfalecem-se perante mim, alguma quietude se aproxima, numa devassidão amordaçada.
 
Para eu, não para ti, é para eu, de mim, para eu. Mas que porcaria tu és!

sexta-feira, 2 de maio de 2014

Agonias do meu ser

Hoje senti:
Pensar em ti faz-me sentir tão só, quando julguei que tudo o que necessitaria como companhia seria a minha solidão!
 
Depois pensei:
Sinto que a minha solidão como companhia é absolutamente e simplesmente tudo o que preciso!
 
Incoerências, dicotomias, agonias do meu ser...

quinta-feira, 1 de maio de 2014

O final

Sentimentos constituídos de finais. Começos desconhecidos em despropósitos de razões. Motivos disfarçados com o único e só objetivo de terminarem, de transportarem ao fim, num perpetuar esgotante de ações sem propósitos.
 
Sim é bom, sei-o, sinto-o. Êxtase incomodado com a inquietante sensação de engano, de equívoco. Mas é bom e anseio que termine, só no final saberei que é bom. No final é bom mas termina, termina e o sentimento açambarca totalmente um ser, num colete de forças que sufoca e fere a mente, como um cilício atroz.
 
Tem de terminar, é bom e por isso tem de terminar. É muito, é demais, é portanto demasiado. Não há sentidos - visão, audição, tato, paladar, olfato, que processem tudo. Não há onde armazenar, não pode ser consumido. É bom, tem de terminar porque é bom.
 
O final nunca é o fim. E depois, e depois do final? Depois do final, bem o início...

domingo, 20 de abril de 2014

Voz silenciosa

Por uma vez, por pouco tempo, hoje... Bom, tão bom, é bom não ouvir a nossa própria voz. Escutar apenas o silêncio dos pensamentos e o ritmo embalador dos sentimentos.
 
Falar é expor, falar é abrir uma brecha impossível de tapar para o nosso real Eu. Possam ser os olhos janelas, mas janelas inacessíveis. A boca, a comunicação verbal é a porta, porta essa escancarada. Pronunciam-se palavras incautas e exposto surge o nosso âmago. Calado tudo é dito, nada é escutado; calado os olhos olham apenas para o interior e buscam nos pequenos estímulos que persistem no silêncio, indícios de descoberta.
 
As palavras tomam energia, consomem-na. Questionável a sua eficiência, energia desperdiçada. Todos aqueles angustiantes momentos que antecedem uma necessidade asfixiante de explicar, de nos fazermos entender, de demonstrar, de conquistar, de arrebatar e nada, nada acontece, as palavras nada trazem. Desperdício de energia que nos reduz à vulgaridade dos números, um entre tantos, palavras, números, coisas nenhumas, crónicas do nada. Tudo acontece dentro, em nós, em mim, pois tu não cabes cá dentro.
 
Ninguém cabe cá dentro, ninguém! Sinto-me tão apertado, tão preso, tão amarrado. Não sei onde pertencer e prefiro encolher-me a rasgar esta membrana claustrofóbica que me envolve, por isso me calo.
 
No silêncio ouço novamente uma voz, a minha voz. No espelho um homem adulto despido. A barba, os ombros, a barriga, o rabo, o pénis. Tudo tão estranho. Abro as mãos simultaneamente, sentido o ar entre dedos, agitando-as suavemente. Desvio o olhar para uma e depois para outra. Deixo-as silenciosamente tocar cada parte do homem adulto, sem que o reconheçam.
 
Do silêncio, uma voz dentro de mim irrompe questionando, mas quem és tu, quem és? É a minha voz, mas não sou eu, contudo que sei eu?!

domingo, 6 de abril de 2014

Compro amor

Sim compro-o, compro o de menor calibre, aquele de letra minúscula, não sobrem confusões, sucumbam as dúvidas, pelo menos estas. Melhor quero-o comprar, mas não sei como, não sei onde, não sei a quem, não sei quando. Nada sei para além que o quero e isso já não é notícia, pois para além do quê, não tem quando, como, a quem, não tem mesmo nada.
 
O amor, compro-o. Sei bem o que quero, sinto-o, anseio por ele, sufoca-me só imaginar. Só, não pela solidão, só tal qual o ar que faz arder os pulmões na ausência. Incendeia-se em mim a sua ausência, esse amor menor.
 
Menor, mais pequeno, ou o único, que sei eu afinal?! Qual afinal? Um tempo, um espaço, uma intenção, imensa partilha, ausência de dor. É esse...
 
As coisas simples; a mão que afaga o cabelo; o bater do coração daquele que nos segura maternalmente nos braços; os lábios ternos, húmidos e quentes que deliciam os meus, numa dança de dois amantes embrenhados em sincronias irrefletidas; o cheiro após o beijo da minha boca, qual flores perfumadas pela chuva calma e abençoada; as palavras que são só isso mesmo, palavras que convidam, palavras que embalam, palavras que fazem sonhar, palavras que dizem mais que o silêncio e nunca menos.
 
E, não é tudo. Quero o sexo, quero-o porque o animal encerrado dentro de mim estripa-me, dilacera-me com as suas garras. Quero, quero mesmo, compro o que quero, compro-o, a ele ao amor, ao sexo...
 
No fim, não posso sofrer, não há desmoronamento de emoções, não há dor infligida, não há dor sofrida. Sem sentimento de perda, sem perda de sentido, sem saudade. Com significado, com intensidade, com partilha, com tudo, mas tudo num tempo, num espaço, num sentido...
 
Paro um pouco, penso no caminho que me trouxe a esta linha. Sinto, tomo consciência, absorvo esta inquietação, traduzo-a minimamente. Vejo dúvidas, vejo confusões... Será que compro, ou será que vendo? O Amor, ou o amor? Não sei, simplesmente não sei, mas quero, quero mesmo muito!

quarta-feira, 2 de abril de 2014

Coisa

Coisa que palavra essa...

Não significa nada e encerra o significado de tudo.

Tudo são coisas e as coisas não são nada.

Se não sabes o que é, coisa será. mas o que é uma coisa? Será coisa?

Realmente é alguma coisa.

Livro Emprestado

Abro-o com o fascínio habitual, perante promessas de me permitir sentir, de lentamente me entregar, de deixar o refúgio para viajar, num espaço e tempo de fantasia imaterial.
 
Página sobre página, busco a confiança, que autoriza a mente a introduz-se na história. Olha para as letras e vejo cores, formas. Olho para as letras e cheiro as personagens, cheiro-as no medo, na alegria, em todos os estados com que vivem encerradas na história na qual me encontro agora. Só de as olhar, a elas as letras, ouço tudo, ouço o silêncio, ouço o ruído. As letras, novamente elas, só de as ler sinto na pele o toque, sendo como que cada milímetro da minha superfície esteja emerso em sensações. O que as letras não me dão é uma voz, essa roubo-a...
 
Já enredado, no feitiço que sobre ameaça dos olhos que se encerram, me faz continuar página atrás de página, como que receando qual película de cinema, o realizador corte a cena e os autores sigam o seu rumo.
 
Eis que me surge um livro dentro do próprio livro. Este sem letras, mas desafiando ainda mais os sentidos. Pistas desgarradas de sentido, peças de puzzle que se prostram perante mim desafiando-me a que as encaixe.
 
Recibo de produtos cosméticos, senhas numeradas de atendimento e acima de tudo areia. Tudo isto, muito pouco, o suficiente... Empreendo uma viagem que me fascina, me esgota, me seduz, me vicia. Datas, locais, qualquer dica, qualquer pista, tudo busco.
 
Encerro finalmente uma janela temporal, janeiro a agosto de 2011. O mais simples está feito, mas não se constrói um puzzle apenas com as peças do canto, não se escreve um livro onde faltem personagens, um local para que essas existam.
 
Tenho-te a ti, és a minha personagem. "Serviços de transporte", "devoluções, D ou B, "obrigado pela visita - volte sempre". Mas mais importante a areia, cada grão como que alojado entre as páginas do livro que encerra as pistas, como milestones na viagem que o meu espírito empreendeu.
 
Insistentemente me tens desafiado. Timidamente aproximo-me escutando esse desafio de forma aparentemente desinteressada e casual, quando dentro de mim explode uma ânsia de expressão. Será este o estímulo? Foi propositado?
 
Com elas, com as pistas consegui toda a matéria prima. Tu a personagem, eu o realizador. O livro dentro do livro, o filme feito livro. Filme porque vejo o movimento fluir ante os meus olhos, olhos esses que observam a mente. Ainda não livro pois não estão vendados os olhos, quando só aí, apenas nesse momento serei capaz de capturar todos os movimentos transformando-os em palavras. Palavras essas que tragam expressão aos sentidos e voz a quem quer ser ouvido.
 
É muito, é demais. Fervilham os dedos como procurando obedecer aos sentidos, a todos os sentidos, mas os olhos pedem só mais um pouco. Esse pouco esgota o tempo, a timidez apodera-se de mim, a ânsia sossega e eu, eu procuro voz antes de conseguir dar voz...
 
Mas está tudo ali, vejo-te mas não te consigo cheirar, não te ouço, não te toco. Tens um tempo, um lugar, uma existência. É esse o apego, a posse de não fechar os olhos para dar voz.
 
E tudo num livro emprestado...

quarta-feira, 19 de março de 2014

Zero

Zero é um. Zero é nada, não existe, apenas está lá. Está lá e não está não conta. Zero para dizer nada, na oposição do tudo, subtraindo o tudo ao absoluto fica o zero e ainda assim é nada.
 
Nada igual a zero, mas será? Ocupa espaço nenhum, tempo algum, expressão do um. O um é zero, o zero que precede o um já é um. Conto como aprendi, como nasci para contar, conto pelos dedos. Tenho dez dedos, um ,dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez; dez dedos, mas e o zero como o conto? Antes do um depois do um, à esquerda e à direita, conto e não conto...
 
Dez, onze, doze, treze, catorze, quinze, dezasseis, dezassete, dezoito, vinte... Dez dedos, dez números! Ando à volta dos números para saber o meu lugar, à esquerda ou à direita, mais visível ou menos visível. Que interessa sei ser o zero e existo. À esquerda sou para não ser visto, à direito sou visto sem saber ser.
 
Tudo porque conto os puzzles pelos dedos. Conto e do 100 ao 108 não há 8 mas nove. Números em extenso, números árabes, mas números. Árabe por não existir extenso existindo. Os dedos não me contam, mas sei que existo. Existo pois, existo e sou um zero!

sábado, 15 de março de 2014

Walking

What's wrong, if is something wrong?
Something seems to be missing,
Something is out of place...
Why do I even care?

Walking alone,
Without any one on my side,
Leaving my footprint,
Letting me know I exist.

Yes I exist, even incomplete,
I exist is true and it's every where to be seen.
If I'm incomplete as it seems,
Why this feeling of being truly myself?

Maybe it's meant to be,
Maybe you aren't meant to me,
But what do I know?
Maybe sadness is my happiness...

segunda-feira, 10 de março de 2014

Conforto da solidão

O conforto que invariavelmente busco e surpreenda-se encontro, na solidão não está. Expurgado de locais onde procurar, sim procurar pois eu sei que lá está, sim está lá pois lá o deixo sempre, sim porque lá sempre o encontro.
 
Rotina diria, ou algo mais. Talvez mais uma forma de sentir, sentir pela diferença, sentir pela ausência ou, apenas sentir por ser só, por ser único. Sentir finalmente completo, encaixar as peças do puzzle e encontrar-me. Encontrando algo, tenho algo, tenho alguém, tenho-me a mim; já não estou só.
 
Ponto de partida igual a ponto de chegada, mas diferente. Diferente pois deixo de estar voltado para fora buscando companhia, buscando conforto, mas voltado para dentro encontro, encontro tudo e mais. Mais poderia eu desejar, se me encontro?!
 
E hoje? Que raio há de errado hoje?! Busco, perscruto tudo e invade-me o desassossego, perturba-me o desconforto. Olho em redor e em redor implica também o meu íntimo. Desagrada-me o íntimo, talvez pela ferida aberta que magoa. Aberta talvez porque nunca chegou a cicatrizar. Desagrada-me sentir que poderá nunca cicatrizar...
 
Exercício perturbante este. Sem sentido, sem alma, sem qualquer conforto... Magoo-me continuando, mas não conseguindo os dois escolho a solidão ao conforto. E...
 
E... amanhã será novo dia!

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Dia cobardemente perfeito

Eis chegada a hora. Coragem!? Coragem não, cobardia sim... Julgara a coragem mais difícil que a cobardia, quando o oposto se prostra perante mim, numa dor sem refúgio!
 
Preciso, tenho, devo... Não sentir, não ver, não ouvir... Encerro os olhos, tapo os ouvidos, fecho a boca... Não vejo, não ouço, não falo...
 
Nada, mesmo nada, não digo, escuto ou deslumbro o que quer que seja. Vazio, só isso, apenas o que preciso em contra posição ao que desejo. Desconstruo tudo em meu redor e só aí julgo possível, espero possível, desejo possível... Mas o quê?! Eu, o quê sou eu. Chegando o momento de ver, ouvir e falar, se possível estarei lá eu, vendo-me, escutando-me...
 
Dita-me a música: " Que dia perfeito, continua a aguentar-te. Que dia perfeito, os problemas não têm de ir... Fizeste-me esquecer a mim mesmo e pensei que era outra pessoa, alguém bom..." E que sentido faz? Todo, todo o sentido verdadeiramente, pois na preguiça de sentir, deixo-me sentir pelas palavras de outros. Mais fácil, pois no final da música bem o silêncio, no final do livro voltamos a contra capa, na imagem desviamos de olhar, e tudo se desvanece. Então porque por mais tempo que mantenha os olhos cerrados, os ouvidos tapados e a boca fechada, quando os abro volta o que a cobardia deu lugar?! Onde estou eu?
 
És o meu farol e a minha âncora. Orientaste-me na tempestade mas agora prendes-me quando de partir eu tenho. Tão fácil ter coragem, tão fácil comparado com isto. Nem farol nem âncora, tenho de continuar a abraçar a cobardia até que seja tão fácil e aí me saberei corajoso.
 
Mas e agora, qual o meu caminho?! Posso não falar, não ouvir, não sentir, mas penso, penso demasiado. Assim nunca me encontrarei, terei sempre receio da cobardia e continuarei a aguentar mais dias perfeitos como este...


quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

A lágrima hoje

Hoje escrevi assim: "A lágrima que falas, essa lágrima que tantas vezes me falta. A lágrima ausente e que teima em não se precipitar pelo meu rosto abaixo. A lágrima que tudo lava, a única capaz de apagar a tristeza e a solidão, a única que nos compreende e abraça pois é parte de nós e perde-se, sacrificando-se para que saciemos a dor e a ansiedade pela ausência do que me faz sorrir..."
 
Sim essa lágrima; mas de onde surgiu ela e porquê hoje! Como sempre e como quando preciso, pelo percorrer do caminho da memória. Não o virtual que apenas acontece na mente, mas o físico e físico é mesmo o caminho que percorria em infância. Pequeno, quase grande, maior mas ainda não grande. Não grande como julgo me ter tornado quando precisei de regredir ao espaço da memória, para sacrificar a lágrima que me salva de tempos a tempos.
 
Nesse mesmo percurso mas agora não pequeno e a pé, mas grande e de carro, passo (presente e não passado porque ainda lá estou), pelas ruas da minha infância e onde outrora existia liberdade, erguem-se agora portões e muros. Não faz qualquer sentido, porque nos cercamos e isolamos do mundo físico? Será para permitir o despudor da exposição sem limites no mundo virtual?
 
Nunca como agora a liberdade nos foi castrada. Terminaram os espaços abertos, os miúdos a correr para casa no final da escola, sem os progenitores recearam inocência roubada. Onde estão os jogos de futebol que eram interrompidos e os postes das balizas afastados para passarem os carros?!
 
A ânsia de esperar cruzar com alguém conhecido, para que naquele particular dia em que estamos fatigados, nos possa dar boleia, está onde? Saudades essa palavra ímpar, saudades de apanhar boleia de alguém ou a alguém retribuir. De trocar os telefonemas sem sentido para ocupar os trajetos sem fim, por uma conversa real, com alguém real e não com uma voz que parecemos reconhecer mas que chega até nós sem compreendermos.
 
Ontem, já ontem dizia: "nunca me arrependi do passado, mas sempre me arrependo do presente!" Disse ontem para hoje sentir isto. Como todos os nuncas, também este o perco no infortúnio das certezas humanas, perco-o para arrepender apenas de não ter pulado mais muros antes de serem intransponíves; de abrir mais portões enquanto estavam apenas encostados e não fechados a sete cadeados; de dar e receber mais boleias...
 
E hoje a lágrima uma vez mais sacrificou-se. Saí da rua, deixei o passado e volto ao presente para me arrepender, mas sem nuncas...

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Redes sociais vs Eu

No pretexto de estreitarem laços, fundem-nos a todos, reduzindo o individuo ao coletivo numa incessante continuação da adolescência, com marcada procura de afirmação na segurança da igualdade de grupos e maiorias.
 
Era mais fácil antes, era mais fácil ser único antes do flagelo das redes sociais. Num ápice todos desejam sol, todos se lamentam da vida, todos sofrem com a morte de alguém, todos estão tristes ou em estado de euforia. Todos respiram, sentem e são humanos.
 
Mas eu não sou todos, quero julgar sentir, ser, estar de forma única. Desejo olhar para os outros como figurantes neste mundo que julguei criado só para mim.
 
O sol é meu, a agonia da vida só eu sinto, a dor de um ente próximo partir apenas a mim me derruba do pedestal da imortalidade... Que direito têm os outros de procurar "A Minha Vida" na imaterialidade das redes sociais?!
 
Quero fugir, quero escapar-me para um sítio onde seja o Eu só mesmo eu. Quando lá chegar saberei ser único, saberei que não há outros, terei a certeza que não mais sentem, dizem ou desejam o mesmo que eu.
 
E aí? Aí faltará algo, faltaram os figurantes, no meu mundo. Mundo que afinal não existe. Existe pois, ele existe, eu sei que sim... O meu mundo sou eu e existo dentro de mim, pois a cada dia da minha existência construo um pouco mais dele. Chegará o dia que me sentirei finalmente pronto e aí, aí mudar-me-ei definitivamente.
 
Vivo voltado para o meu interior, mas não é o suficiente. Chegará o dia que colocarei a última pedra, encravarei a engrenagem e mais não voltarei. Procurem-me aí nas redes sociais...

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Fragilidade das palavras

Sozinho na companhia das palavras que escolhem ignorar-me, desprezar-me talvez. Ainda assim a melhor das companhias.

Mentira, não é verdade. A verdade é que me preferia a mim de companhia. Não este eu desprovido de cor, entusiasmo, de vida... Mas o eu que preenchia as reticências com continuidades de paixão, espírito, alma.

Pronto, estou sozinho. A ausência do eu que fui origina-me pânico.

Olho para o relógio e... Desejo que cá estivesses. Confrontado com os ponteiros que são agora números, deixo-me saber que se aproxima a hora de chegar e... Desejo que nunca cá chegasses! Tu chegas e eu não posso estar comigo.

Mas que porra, que revolta, que incompreensão... "Tu estás tão sozinho, és tão só". Que péssima companhia das palavras...

Queria dizer hoje o adeus, queria abraçar-te juntinho a mim... Antes de pedir-te desculpa, creio ter de me desculpar. Tenho de dizer-te o adeus, tenho de combater o receio, o pânico, a fraqueza. Tenho de não me forçar a viver, só para poder viver.

Perdido, só e encontrado na companhia das palavras. Palavras essas que não me dizem nada, nem me ajudam a que algo lhes diga. Com mentira digo a verdade e sim vocês são a minha melhor companhia

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Existência anónima

Para alguns uma arma impercetível, algo que captura o bem talvez mais precioso - a Alma. Para mim apenas uma desculpa para explorar, para me aproximar, para perscrutar emoções genuínas em pessoas de carne e osso, no cenário que melhor conhecem, as suas vidas quotidianas.

Estranha intrusão na vida alheia, apenas como simples forma de escapar destas quatro muralhas em que encerro a minha própria existência. Mergulhando na dor, no esgar do olhar, nas subtilezas dos gestos, descubro uma estranha tranquilidade.

Que pacífico, não falar, não escutar, não refletir, existir sem qualquer forma de diálogo. Procurar a invisibilidade para realmente existir. Circular entre desconhecidos e captando a energia, tal qual colecionador captura as borboletas. Por vezes frágeis, por vezes monstruosas, por vezes belas, outras vezes dissimuladas... Tudo é diferente, tudo necessita ser captado, tudo tem o valor.

Com o álbum preenchido na mente, tomo o caminho das quatro muralhas e da experiência da energia sorvida, desperto lentamente do coma e sobrevivo mais um tempo, quando o desejado era mesmo viver!


terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Asas e sonhos

A vida que sonhamos e a vida que temos. Separação entre realidade e sonho...

Hoje o dia trouxe-me o bilhete para a viagem e não entendia o porquê. Agora que a inicio vejo-me forçado a fazer uma pausa, por a compreensão me ter encontrado... A dor da recordação da partida cuja distância dos anos, dos meses, dos dias, horas, minutos, segundos, de todos os instantes que meço e sinto, não apaga ou atenua, inunda-me sem aviso. Pelo amor da mulher que partiu, da mulher que fez em grande parte o homem que sou hoje, permiti-me dizer a quem o devo, de dizer com toda a profusão do meu coração, de dizer: amo-te...

É tempo de retomar a viagem...

Porque não se transforma o sonho em realidade, para que a vida tome a dimensão desejada? É a realidade que aprisiona o sonho. Sonho porque tenho tudo para o fazer, sonho porque posso sonhar, e sonho simplesmente porque realmente não o sei viver.

O sonho dá-me as asas que me permitem voar, elevar-me e contemplar o meu mundo na segurança da soberania das alturas. A realidade aprisiona como um pássaro na gaiola. Tenho as asas mas fico confinado ao espaço da gaiola. Da gaiola não existe a noção de elevação...

É na verdade tão simples, mas tão simples. Um pássaro toda a vida vive enjaulado. O pássaro tem asas, o pássaro voa. O pássaro por natureza deveria voar, homem por natureza deve sonhar. O pássaro na gaiola não pode voar, o homem poucas vezes se permite viver os sonhos...

Um dia retira-se o fundo da gaiola e o pássaro teme; um dia o homem tem a possibilidade de viver o seu sonho e teme. O pássaro que tem asas, que deveria voar fica nesse momento assustado com medo das alturas, pois julgou que as asas foram feitas para sonhar e teme cair. O homem que deveria sonhar e viver os seus sonhos, fica nesse instante com medo de voar, pois julgou que as asas eram feitas de sonho.

Pássaros com medo de alturas e homens com medo de sonhar... Tão simples, tão real, tão meu...