Madrid, que falar sobre Madrid?! Assentando a poeira no seu devido tempo, sempre é mais fácil subtrair um pouco a euforia da novidade, da descoberta, das expectativas goradas, da imensidão do mundo novo que abraço no início de uma nova viagem.
Descrever qualquer viagem para mim, tem sempre um denominador comum, algo a que não me esquivo de exaltar pela aspereza com que me deixo moldar pelas mesmas. Oprimo-me, com alguma relutância é certo, mas ainda assim com assertividade, a retratar esse denominador comum, falando mais de Madrid e não tanto da minha Madrid.
Mais duas das três notas prévias, antes de me lançar no desafio. Tento manter sempre presente a disparidade imensa do significado dos verbos estar e conhecer. Estive em alguns lados, conheço muito poucos; estive em Madrid, não conheço Madrid. Último exercício do prelúdio, serei guia mas apenas da memória, não intento nada mais para além disso...
Tema mais delicado, mais visceral para mim, o movimento gay. Programa RTP1, "Conta-me como foi"; Paris estava para altura em termos de expressão e liberdade heterossexual, como Madrid está para a homossexual nos tempos actuais. Não sou homofóbico, ou melhor não me considerava, mas senti-me oprimidíssimo, uma minoria, um perfeito ensaio da sexualidade, em que o que assumo como maioritário passa a minoritário. Cidade meca, para casais gays e toda a sua exuberância, são imensos e as expressões de intimidade transcendem em muito o que socialmente é aceite para os casais ditos normais, em todos os países por onde passei. Senti-me afrontado nas minhas liberdades e ao mesmo tempo ébrio pela curiosidade; senti-me por vezes peça de carne, outras mirone doentio. Aspecto positivo a liberdade e igualdade de direitos; aspecto negativo os excessos de quem não sabe viver a liberdade e usa pretexto da anterior opressão, para oprimir (Chueca é o exemplo).
Cidade funcional. Rigor na limpeza urbana, bem dotada de infraestruturas, excelentes espaços verdes em termos de qualidade, localização e quantidade, sistema de metro bastante extenso e intuitivo; não se sente insegurança, polícia sempre presente. O custo de vida é bastante elevado falseado pela questão turística, os preços acrescem perto dos centros de interesse e ao fim-de-semana; uma cerveja vai dos 3€ aos 6€. Habituais presenças de arte de rua na sua expressão mais bela, como também da mendicidade.
Arquitectonicamente, espaços bem conseguidos, funcionais e sem muitos edifícios devolutos nas zonas históricas. Ponto positivo, sentimento de cidade como um todo, organismo vivo, ponto negativo o excesso. Aspectos culturais. Imensa oferta, a preços convidativos ao contrário de tudo o resto. Sem grandes filas, bem organizadas e bem assinaladas. Vibra cultura a cidade, orgulha-se da usa herança, do seu espólio e demonstra-o. Arrisco-me alongar e não mais terminar, como tal abro o para quedas antes de tempo e recomendo um qualquer guia, onde seja descrito com rigor e imparcialidade. Permito-me contudo a falar do orgulho mais do que turístico da cidade, por D. Quixote e seus companheiros. Uma vez falado, calo-me e deixo o para quedas fazer o seu papel...
Cultura local. Multidões de gente em todo o lado, difícil reconhecer o verdadeiro madrileño, se é que o existe. Doença de qualquer grande cidade, a mescla é tão grande que obriga a uma redefinição da identidade. Madrid tem algo diferente contudo, reúne numa só cidade um só país com todas as suas diferenças; encontramos um pouco de cada uma das regiões de Espanha. Tipicamente as pessoas são afáveis, expressivas e comunicativas, visão bem castelhana. A gastronomia é a esperada, não me vou alongar, apenas registo que fugir dos circuitos habituais pode assegurar baixa de preço, mas não aumento da forma genuína ou qualidade da comida.
A importância desta viagem nesta frase da minha, assemelha-se a um parênteses que permite respirar. Aberto o parênteses, a relutância em o encerrar é superior ao previsto, salve-se que aí vem Hannover...
Ao flutuar na dimensão da tua viagem, tenho a nítida sensação que conheci Madrid através das tuas palavras. Já passei por lá mas até ler-te o meu consciente andava zarolho, vi mas não senti o que agora deslumbrei ao olhar esta fotografia.
ResponderEliminarBordas os teus momentos com fios delicados de aventura e semeias em mim a entusiástica busca que leva os mais curiosos à descoberta. A tua forma selecta adoça e embeleza detalhes que tendem a fugir aos "comuns", detalhes esses que facilmente se tornam nadas e que tu tão bem supervalorizas.
Afagas, mimas esta tua experiência de tal forma que me me ofereces uma ilusão nunca pensada e desmedida que me leva nessa viagem convosco num fim de tarde diáfono deste início de Maio.