"Onde vais?" Recordo-me eu de ter ouvido e pensei: onde fui?!
A necessidade de impressionar o chefe, não pela relação hierarquica, mas pela pessoa, pela experiência, pelo trajecto de vida saiu hoje abalada. Digo: cuidado que escorrega!
E saio disparado para o carro tentando evitar a chuva. Contorno a traseira do carro e dou o tombo da minha vida... Ouço: "Onde vais?!" Tão depressa caio, como me ponho a pé e um estrondoso FODA-SEEEEEEEEEEEEEEE ecoa pelo mais profundo do meu ser interior. na boca só se vê um sorriso.
A cena já é lamentavel o suficiente e é agravada por ter sido assistida por dezenas de pessoas, que viram a sua refeição ser coroada com um idiota que se espalha ao comprido numa merda de uma poça. Olha e penso: "QUE CARALHO DE MERDA, nunca mais cá venho almoçar!"
O balanço mostra um cotovelo toda amassado, todo o corpo do lado direito dorido, mas pior que tudo, e isso não há soro fisiológico nem betadine que cure, a dignidade destruída...
Chego ao gabinete, oriento um polo, umas calças de trabalho da empresa 4 numeros acima; meto papel para nao sentir a humidade dos boxers molhados; respiro fundo e penso em trabalhar e passar as 4 horas que me faltam para o fim-de-semana. Levanto-me e o gozo total, desta vez pelas calças. Pareço um palhaço, dizem eles. Penso para mim: PUTA QUE PARIU hoje não é mesmo o meu dia!
Caso para perguntar: "Onde vais?!" Ao que responderia: "Se soubesse, se soubesse..."
Onde vais?! Poderia simplesmente ter terminado assim, mas não...
Começa o meu dia finalmente, são 18h! O habitual berro interiorizado ao cumprimentar os vigilantes de serviço e passar o portão das instalações.
Sucedem-se as ideias do que fazer. Apesar de magoado fisica e mentalmente nada me pára, afinal é sexta-feira e eu "estamos eléctricos". Eis que reparo na indumentária... Calças com faxas luminosas, risca ginásio, risca qualquer lugar social... Porquê não sei.
Amuado recordo-me que posso ir levantar novo livro; esqueço-me da indumentária e entro alegre pela biblioteca dentro. Olhares cruzam-se e apontam num só sentido, espera lá é em mim. Procedimento como fiz várias vezes e olham na mesma. O livro que quero está requisitado. Começo a ficar irritado, resolvo "atacar".
Kafka tem?
B: Isso é?
Literatura checa.
B: É para si.
Não é para o meu filho. Ainda só lê esta literatura ligth mas qualquer dia já lê o mesmo que eu. (esta confesso não disse)
(em vez disso) Sim, "O processo" de Kafka pf.
Ainda me recordo de tecer algumas considerações do "metamorfose" que "odiei mas que apercebi no final que me tocou de forma única e inexplicável, mesmo repugnante e que penso ser essa a vontade do autor". Podia ter falado na traição do amigo que publicou os 4 livros após a sua morte contra a sua vontade... Não foi preciso, o que aparenta não é - ficou bem evidente.
Corrida "forte a forte", excelente música, o corpo não reclama. Termino, encho os pulmões de ar, de mar, de iodo e sou brindado com um fabuloso por-de-sol e ninguém com quem partilhar. Melhor assim...
Igual ao por-de-sol que a "coisa insecto" via do seu quarto e que lhe trazia significado!"