sábado, 27 de fevereiro de 2010

Momento de colecção

O prazer da fuga, o prazer da descoberta, o desejo de conhecer, a necessidade de evasão. São tudo imperativos, definições e necessidades, que ilustram atracção não pelo destino, mas pelo simbolismo da viagem. Ainda não sou um viajante, mas apenas um turista. A espaços o primeiro, o segundo por conforto.

Em vésperas do mês que mais próximo estarei de passar tanto tempo em viagem com em Portugal, faço um pequeno exercício. Num paráfrago uma análise retrospectiva das minhas viagens. Acto de puro coleccionismo, mas inicia um processo de despir roupas e entrar num casulo do qual sairei viajante, em que o único conforto que necessito transporto comigo.

Destinos de praia, destinos de frio; Europa ou Mundo; trabalho, lazer; não há divisões, que não uma, o avião é o ponto de partida e chegada.

Verona, Itália, Janeiro 2010 - Cidade encantada, história e modernidade, um rio abraça intensamente a cidade que se volta para ele como sempre lá estivesse estado. Evidências relevantes da presença romana e distribuidas entre inúmeros locais de interesse. Romeu e Julieta são referências obrigatórias. Cidade que merece um regresso.

Munique, Alemanha, Dezembro 2009 - Foi esta a última cidade que visitei na Alemanha e sem dúvida a que mais gostei. Visitei mais cidades alemãs que espanholas, das principais falta Berlin que me recorde. Munique destaca-se das restantes pelos seus inúmeros castelos e palácios, a forte influência da cerveja na cultura. Mantem organização típica alemã, mas sai enriquecida com arquitectura bastante poupada da 2º Grande Guerra Mundial.

Wroclaw, Polónia, Dezembro 2009 - Cidade muito curiosa na qual não se encontra um só símbolo do comunismo, mas onde o comunismo prospera. Crise de identidade que se prolonga pela gastronomia, arquitectura e postura social. Vale a pena conhecer a malta mais jovem sedenta de contacto exterior.
Imensas pontes...

Girona, Espanha, Dezembro 2009 - Cidade que se desenvolve nas encostas de uma colina delimitada por um rio. Relação equilibrada, destas duas geografias distintas. Vestígios árabes, romanos e católicos em harmonia. Catedral fabulosa. Fica a vontade de voltar e conhecer a cidade cheia de gente com alegria contagiante dos vizinhos ibéricos.

Wales e Stoke, Reino Unido, Maio 2009 - Stoke típica cidade industrial inglesa, sombria, suja e com poucos locais de interesse não fosse um extraordinário tempo com sol e uma feira de antiguidades nas margens de um dos imensos canais, para encher de cor e uma alegria invulgar. Que dizer de Wales?! Fabuloso, fiquei simplesmente rendido ao encanto e contrastes de um país muito pouco conhecido. Lagos, serras, uma costa magnífica de contos de fadas com castelos incríveis. O mais belo por de sol de sempre...

Madrid, Espanha, Maio 2009 - A cidade desiludiu no que toca à movida louca, encantou pela oferta cultural em especial o Museu do Prado e a obra de Bosch, agradou pelos locais de interesse, chocou com o comportamento de excessiva expressão sexual. Uma cidade muito próxima que merece fugidas frequentes.

São Miguel, Açores, Fevereiro 2009 - Cumpriu tudo o que necessitava e nunca me senti tão em casa como lá. Tão em casa e ao mesmo tempo num sítio tão alien. Nas costas o verde, em frente o azul, natureza e mar. Cheiros, cores, sons, sabores, tudo se conjuga na perfeição e tudo tão identificável comigo. A minha Terra do Nunca... Mais de que voltar, viver lá um tempo.

Milão e Bergamo, Itália, Outubro 2008 - Milão não encerra muitos segredos, gente bonita por todo o lado. Galeria Vittorio Emanuelle II, um espaço de beleza com lojas de algumas das mais caras marcas. Um Teatro Scala que exteriormente desilude e uma Catedral que é a mais bela que tive oportunidade de visitar. Bergamo é uma cidade dividia em dois, a cidade alta e a baixa. Visitei a alta, monumentos que mais não são que casas entre uma muralha fortificada. Muita história e muita vida emprestada pela faculdade.

Barcelona, Espanha, Maio 2008 - Cidade que vibra, que transpira vida, cultura e identidade que orgulhosamente ostenta. Impossível falar em Barcelona e não referir Gaudi, com todas as obras deixou e perpetuarão o nome da cidade. O mar abraça a cidade, ou deixa-se abraçar por ela. A primeira e até agora única cidade europeia que ponderaria viver.

Uvero Alto, República Dominicana, Setembro 2007 - Caraíbas, calor, mar azul turquesa, ritmos quentes, rum, música, animação, belezas naturais soberbas. Uma cartaz turístico e pouco mais há acrescentar. Insuficiente para voltar a cruzar o oceano e regressar.

Praga, República Checa, Fevereiro 2007 - Cidade ideal para namorados. Demasiadamente turística mas com tantos pontos de interesse que é fácil diluir e sentir-nos menos turistas e mais viajantes de passagem. 360º de surpresas e desafios de interpretação que nos prendem a cada segundo. A noite traz uma nova cidade, voltada para cabarets e todo o tipo de loucuras, difícil é estar no sítio certo...

Varadero e Havana, Cuba, Setembro 2006 - Varadero é igual a qualquer outro resort das Caraíbas, talvez com um pouco menos de qualidade no hotel. Havana e Cuba em si, são um observatório político-social quase laboratorial. Caminhar em Havana é regredir no tempo, no bom sentido é viver, sentir história. Diria ser impossível se não tivesse visto. Infelizmente está a perder-se a mística actualmente, fica a memória e o desejo de não voltar para não adúlterar o sentimento que ficou.

Porto Seguro, Brasil, Maio 2005 - Cidade pequena (meio milhão de habitantes), das mais seguras do nordeste. O que se diz do Brasil é verdade e não é apenas o turismo sexual. Certamente poderíamos todos aprender um pouco com a postura daquele povo e a forma de abordar e relativizar os problemas. Estou a ler o livro Capitães de Areia e recorda-me aqueles miudos que se deixam conquistar pelo carinho. Brasil é um continente e brevemente regressarei para visitar os familiares.

Ilha do Sal, Cabo Verde, Setembro 2004 - Ilha extremamente árida no clima e geografia mas com muita riqueza do povo. Ultrapassada o habitual choque com a cor das pessoas onde passamos a ser minoria, relaxamos e sentimos a impregnação do crioulo. A ilha não tem muito para ver, o clima é incrivel e estável, a cultura com as suas mornas, o grogue, a dança surge em todo o lado. A camaradagem e entre ajuda entre os miudos é algo incrivel que nunca vi em mais lado nenhum por onde passei.

Riviera Maya, México, Dezembro 2003 - Das Caraíbas o mais belo destino que visitei. Equilibra beleza natural incrível e única no mundo, com conforto e segurança no turismo e a história da civilização Maia. Tudo nos é permitido experimentar em troca de capital sejam pesos, dólares ou euros.

Outros destinos houve e muitos mais virão. Este exercício permitiu-me retirar recordações das gavetas, limpar o pó e voltar arrumar. Os sentidos acordados mantêm-se bastante actuais e são passos na minha viagem.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Música Clássica

Momentos de egoísmo, um bom vinho. Espera, acrescenta uma tábua de queijo... Música clássica e poesia, o casamento perfeito, em puros momentos de partilha egoísta entre mim e eles, eles os sentidos. Ambos prazeres tardios, mas que despertaram juntos e no exacto momento que me permite apreciar devidamente.

Ainda agora gatinho e já a minha mente é transportada a visitar sensações desconhecidas. Apenas as percepciona, ainda não as interpreta. O que fará quando caminhar...

Gatinho agora, mas já sonhava ter gatinhado, quando sonhar era gatinhar. Cada crescer, cada explosão, cada estremecer, cada grito, cada arrepio com que os meus sentidos correspondiam a um maestro que não via, mas que me guiava, indicavam que havia algo. Juntei pequenas pecinhas, construí um puzzle e confirmei. Ouvia quando não tinha idade para caminhar. Acalmava-me disseram-me. De irriquieto passava a um transe profundo, corpo rígido e olhos sem alma...

É épico, não ouço o homem ouço sim a natureza. Cruzo montanhas, atravesso desertos, mergulho em mares e rios. Os ouvidos são os anfitriões. Os tambores são trovoada, as cordas água e vento, as flautas as vozes indecifráveis dos seres vivos, os pianos o fogo... E deixo-me levar, nesta palete de sons...

TCHAIKOVSKY em vinil fazia os meus encantos e no meu cérebro menos infantil e mais infame, antevia o prazer que me traria cada reacção da agulha a beijar cada rugosidade do 12". O meu vinho enebriante...

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Solidão

O que é solidão?! É estar sozinho agora, prostado no sofa olhando pela janela sem nada procurar? Ou será a solidão estar na multidão de gente e sorrir, sorrir, sorrir? Sorrir é a melhor alternativa a tudo o resto, fazer sorrir é fácil.

Solidão não se sente, solidão não se procura, solidão não é nossa. É ruído sem barulho, é cor sem luz, é tacto sem contacto. Não existe, simplesmente não existe. Conceitos de irrealidade difusos na exasperante vontade de viver. Porque é a solidão a ausência de companhia e não a companhia uma negação da solidão. O oposto à solidão é apenas uma costela desta, que mais não vale que uma expulsão do paraíso.

A minha solidão é a melhor companhia de todas. Conversamos, pensamos, sorrimos, choramos, tudo fazemos sozinhos. Somos autónomos, somos um só. O convite para a partilha é recíproco e tácito. Entendes-me?! Entendes mesmo?! Sorriso de tranquilidade num maternalismo que não posso recuar e recuperar... Não te exponhas, não te reveles, não te mostres, sabes o que acontece... Obrigado tens razão!

Se quero ficar sempre contigo?! Deixas-me levar um livro?! E se for mais que um, e se for o livro?! Posso levar uma música, várias músicas, a música?! Posso levar algumas coisas, a coisa? Se calhar ainda não estou pronto, mas eu quero, eu quero realmente, realmente quero e vou, conseguir irei e juntos estaremos.

É tudo o que tenho por certo, é o único dado adquirido, no entanto por vezes sentimo-nos tão sós...

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Definições

Recebo definições do meu Eu social sem as pedir, mas hoje pedi e tendo pedido foi uma surpresa o que recebi. Recebi e também esbati um poucos as margens difusas do objecto no qual cabe uma qualquer sombra de definição minha.

Muito encaixa numa definição, mente com bouquet perfumado, de estrutura sóbria na atitude, deixando um trago agridoce na conquista do desconhecido. Poderá ser um pessoa ou um vinho, ou outra coisa qualquer, objecto ou ser vivo. Falo de amor, como falo de projectos, como falo de sentimentos é tudo uma amálgama de ingredientes que se conjungam para projectar a forma física com que sou percepcionado. A complexidade é por isso logicamente intuida na perspectiva que soa mais familiar ao receptor.

Intuir não será o meu esforço, venha a definição. Estou na fase da ovulação, a minha mente encerrou-se. Em seu redor número incontável de espermatozóides, feito ideias, feito sentimentos, feito projectos. Todos tentam nenhum a convence. O tempo escasseia, o período de fertilidade aproxima-se perigosamente do fim, e a mente encerrada. Foram alguns as ideias frustadas, os sentimentos perdidos, os projectos fracassados. Ela não quer, eu quero, ela manda... Que se foda a mente, venha a menstruação, não haja tampão que impeça a hemorrogia de uma mente que teve medo demais de viver. Outra mente tomará o seu lugar e novos espermatozóides surgirão debatendo-se por a convencer. Tudo muda e só eu permaneço igual... Complicado, quem eu?!

Parece descontextualizado mas de facto encaixa como a última pedra que segura a abóboda da Catedral que presta culto à minha definição. Remeti-me para o silêncio quando li e não sei como sair... "És uma pessoa extremamente sensível, intensa, profunda e inteligente, ou não, e é apenas uma patologia da personalidade mascarada com essas características (...) Procuras excessivamente a essência das coisas... da vida... dos sentimentos... das relações... esperas demasiado das pessoas, parece que ninguém te completa... queres de mais... assim não vais longe, não vais ser feliz... Descomplica a vida (...)".

O que não tem mesmo nada haver mas distrai-me com um sorriso que julgam não caber neste espaço, onde estas palavras surgem, é a seguinte partitura de humor, acalentando ternura.

"Monsters are real, and ghosts are real to. They live inside us, and sometimes, they win". Stephen King

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Nota de culpa

Era perfeito, era tudo tão perfeito. A forma como me olhavas, não podia ser engano. A forma como os teus lábios recebiam os meus, tiravam o sentido a tudo em que o nós não estivesse presente. Foste feita para mim... Como é que algo tão certo pode ser tão errado?
Surgiste e foste, sem agora sentir que cá estivesses. Sinto apenas que uma enorme parte de mim foi arrancada. Porquê, mas porquê?! A minha mente está entranhada do sonho, o sonho que vi em ti, o sonho que fiz para nós num egoísmo que abraças-te como teu.

Quero que partas, quero que desapareças, mas quero que deixes o calor do teu abraço que me apertava a pontos de magoar. Deixa-me a paz que encontrei nos teus olhos. Preciso ficar com a ilusão que é possível, mas parte, parte por favor. Desesperadamente tento agir como sei, como resposta ao que não sei e no fim recebo com juros mais desespero. Poderá alguém julgar que amou sem nunca ter amado?

Eu sei, eu sei mas estou amordaçado. Que importam as fraquezas humanas?! São para humanos, mas o que floriu não tinha fragilidades, não foi tocado pela demência humana. Mas então e porquê, porquê... Na tua mala de bagagem leva as fragilidades, todo o mal, toda a dor, porque isso não quero guardar.
Fujo, isso eu sei, fugir para frente, para os lados, o percurso não interessa. Antes tivesse sido traído, mas não fui. Não sendo fui-o, a traição foi minha, de mim para mim, é o que mais doi. Chega, tens de partir que alguém poderá estar a chegar...

Nesta estória de conto de fadas que se pode iniciar, a princesa apenas chega após as doze badaladas e eu saio primeiro sem o sapato de cristal para a encontrar. Entre máscara e capa em que me escondo, será ela que me encontrará...

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Fugas

O que há com a música que nos consegue fazer sentir tão próximos de nós mesmos?! A música é alimento, é bebida, a música preenche-nos, identifica-nos, aconchega-nos, enche de energia, transborda a melancolia. Pelas notas suspensas nas pautas encetamos viagens longas, derrubam-se barreiras...

O mar está calmo, não há correntes, não há vento. Cansei de nadar, cansei de esbracejar, simplesmente estou à deriva, numa sensação de quem mais não tem a perder. Uma nota, duas notas, uma melodia, uma voz, uma música e depois outra e mais outra. Sinto novamente movimento debaixo do meu corpo, estou de volta à estrada, ao mar, ao espaço do meu infinito, a música leva-me...

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

O Penoso Ruído do Silêncio

Como pude esquecer?!

Emaranhado de pensamentos que precipitam numa turbulenta sensação de desconforto, confortado na sensação de segurança, atingida pela distância dos acontecimentos...

O poder do silêncio é enorme comparado com torrentes de palavra sem nexo, que são despejada apenas porque somos capazes de o fazer. Como se isso fosse um poder capaz de nos colocar do lado dos X-man.

O silêncio invade-nos a alma, afunda tudo em nosso redor numa pintura esbatida surrealista, que aliás sempre o foi. Pessoas, objectos inanimados, seres vivos... Tudo uma mescla de cores esborratas como maquilagem no rosto de um Deus que chora pelo insucesso da sua criação e pela traição do seu sonho idealizado!

Sinto-me invadido por esse tirano. Não tenho maquilagem porque a minha morada não é no Olimpo, mas sim tenho sonhos. Preciosas e imensas são as horas com total abstração de palavras proferidas e não escritas, mas não tem importância, nem tomo consciência do facto.

Decorreram 5 anos, de mais de 5 anos de uma outra vida que não requereu morte e nascimento. Um novo ser toma forma neste mundo. Conciliam-se recordações de tardes de brincadeira desprovida de maldade e preocupação, com a imagem de uma criança no colo. Analepse para os 5 anos e para os motivos do fracasso. Aquela criança poderia estar num outro colo... Prolepses no espaço e no tempo, com transporte da mente para um presente futuro que deveria ser o meu, mas que não o sinto como tal.

Não gosto do que este silêncio me diz, por isso vou experimentar falar...

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Esponja de Sentimentos

Pensamentos bem presentes quando os sentimentos não chegam do passado ao presente, porque a porta da sobrevivência disfarçada de egoísmo bloqueia...

Há várias ideologias que mantenho bem presentes na mente, para me permitir abrigar numa ilha de reconforto, quando tudo o que sinto é oposto à serenidade pela qual em agarro de unhas e dentes.

Dissabores afectivos; "A boa notícia e a má notícia, são a mesma e uma só!" Todo o ser humano gosta de se ver como actor principal desta peça maior que é a humanidade, quando afinal "foste tu, sempre tu e nunca eu", seja o tu, o todo como indivíduo ou o indivíduo como o todo.

Serão as lágrima e as gargalhadas de Platão?! Não precisarei com exactidão, mas todos os dias e em todos os recantos alguém repete estes sentimentos e jura estar a sufocar de tamanha dor. Os sentimentos não são inventados, são distribuídos e transmitidos infinitivamente. Custa descer do altar em que nos colocarmos e atingirmos a percepção que afinal não somos tão especiais e que muitos outros passaram, passam e passarão pelo mesmo e não é que sobrevivem?!

A curiosidade pela mente humana e os processos por detrás do observável, desperta em mim uma mórbida necessidade de ajudar, com camuflagem de altruísmo. O final: e todos viveram felizes para sempre, é uma consequência e não um fim. É como um neuro-cirurgião que opera o cérebro dos seus pacientes em estado de vigília. Pois bem, é uma oportunidade única de observar o ser humano, em toda a sua fragilidade, em toda a sua dimensão, em todo o seu dinamismo, em toda a sua pequenez... Ali, expostos, nús, não será esta a maior prova de confiança?

Sempre vivi, talvez por o acaso, ou talvez por necessidade, rodeado de provas de confiança. É enriquecedor, é único e cria relações de intimidade e cumplicidade extremas que perduram para as habituais fronteiras espaciais e temporais à escala do ser humano. Contudo é tão desgastante. Uma esponja, em toda a sua função, é como me sinto por vezes. Passo, lavo, e transporto comigo parte da angústia, dando lugar a um surpreendente conforto na pessoa. Observo tudo isto com fascínio, quando tudo o que bastou foi escutar, provocar sorrisos, forçar a lágrima quando se imponha, proferir simples palavras e selar tudo com um abraço, que se estranha, se aceita e se deseja como oxigénio para alguém que se afoga.

Ela está lá, parece não ter formas e contornos de ser vivo. O mais fácil de explicar a uma criança é que é made in china, mas não... É, ou foi, um ser vivo e não uma planta, mas sim um animal. Se me baterem doi-me, se me magoarem choro, sei o que é alegria e atravesso o mesmo deserto de desespero humano. A esponja tem um limite, não absorve sem fim. Esta esponja só pede que não lhe fechem todas as saídas, não me cerquem, deixem-me aqueles espaço de fuga para um refúgio só meu... Prometo voltar e simplesmente estar presente para os vossos votos de confiança!

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Início de um diário

O sorriso é sempre o mesmo, quando um livro amolga vigorosamente a resma de papeis inúteis que enche a minha caixa de correio e esvazia um entusiasmo ridículo de encontrar algo mais que publicidade ou contas. A minha dealer, a minha fada dos livros, deixa o meu tesourinho e sempre, mas sempre, deixa um bilhetinho com palavras simples, porque simples é a chave que abre a alegria ansiada.

Desta vez será diferente e o gesto de devolução na caixa de correio da vizinha, levará não só o livro como uma visão para além da porta que se abriu. Linha por linha, página por página, proponho-te este diário a dois, num egoísmo que é só meu porque não pedes nada, nunca o fazes, apenas dás. O caderninho será o álbum de fotografias que encetei, quer queiras quer não estás na viagem...Viajo, sem esperas em check in's, sem jet lag, sem dispender dinheiro e trago muito mais que fotos e sensações de efemeridade. É esta a viagem que te descreverei.

O livro que terá o prazer de abrir este diário, merece a honra porque enorme foi o prazer que me oferendou. Começando pelo livro material, extremamente gasto, folhas amareladas, amarrotado, de textura macia de centenas de dedos que as tocaram, por vezes numa fúria incessante por devorar página sobre página tentando descobrir o que acontecerá, outras vezes vagarosamente sorvendo cada estímulo e prazer do que retira.
O livro, o autor, Paulo Coelho, O Alquimista, a ordem errada a fórmula certa. Este autor há muito deixou de pertencer à minha escolha. Não porque não goste, mas porque rock stars não podem ser bons escritores, nem o inverso. Preconceito talvez, mas não o impinjo, é apenas meu. Sempre numa toada espírita com a qual me revejo, tenta encontrar significados para ânsias "auto-humanas", seguindo uma linha de auto ajuda, retirando qualquer significado.

Lenda Pessoal... Entendo que este livro é o significado, o alicerce, o big bang, a molécula, de toda a obra do autor. Uma obra e tanto, que necessita a reflexão individual, para uma percepção múltipla e humana. A minha é minha...


domingo, 7 de fevereiro de 2010

Pelas palavras dos outros

Cruzo-me, felizmente, com gente que me enriquece e acende uma centelha de luz e esperança. De uma dessas pessoas recebo estas palavras, num dia muito curioso. Acordei nesse dia, 17 de Maio, dois dias antes de fazer anos e num desafio de uma amiga, revejo mentalmente a lista para o meu aniversário, para que me tratem de tudo. Há só um nome nessa lista para que tenha significado essa data e essa pessoa não pode estar. Na agonia das primeiras horas do dia, decido que é o sinal que preciso. Após o almoço estas palavras, trazem uma certeza redobrada.

Sabes que eu te compreendo, e tu acreditas compreender-me. Não deixa de ser irónico que a estrela que conduziu os Reis Magos ao Menino, também o tenha colocado em perigo. Nesse dia disse o meu sim para a vida e tudo fiz, nesse dia coloquei-me em risco. E agora como me comporto?

"Desde que te conheci que te quero dizer algo que vi em ti e estive sempre à espera do melhor momento para to dizer... Talvez numa conversa a dois sobre a praia, mas esse momento ainda não chegou e há determinadas alturas em que sou invadida por momentos de racionalidade e de uma vontade de fazer (como agora), em vez de aguardar pela altura certa. Precipitação para alguns, criação do momento certo para outros. Escrevo porque tudo tem o peso do registo ao invés de poder largar as minhas palavras ao vento, senti que acreditas no amor e que vais encontrar a ou uma mulher certa para ti (em relação a essa temática tenho as minhas dúvidas). Também assim o acho, mas enquanto sentires esse medo de que podes não achar, de que algo pode não ser perfeito e que a páginas tantas descobres que afinal aquela não é a pessoa certa, de que algo falhe e tu te magoes ... enfim não te entregas por medo de muita coisa, mas principalmente por medo de sofrer de que te tirem o tapete, de perderes o controlo da tua vida, algo que dás muito valor ...

Pois Joel só te digo vence esse medo e descobre o que para lá está depois dele ... escolhe a tua mulher e luta por ela, a mulher que escolheres é que de facto pode ser a tal. Acredito em príncipes e princesas, em magia. Toda a minha estória foi mágica, só o sei porque fui capaz de ver a magia (e com dor digo, acho que fui a única), mas a vida mostrou-me que caso esta estória não tenha um final feliz outras poderão seguir-se com um final feliz - tu mostraste-me isto, há mais pessoas mágicas e momentos mágicos o que temos é de ter a capacidade de ver de sentir essa magia. O que não foi aquele momento na praia do que um momento de magia!

A vida tem tanto para nos dar ... temos que saber o que queremos dela. Perdoa-me a intromissão, mas se partires para uma relação com a mesma intenção com que abraçaste o teu casamento acredito que não vai longe ... Não é a vida, nem o destino que fazem as coisas acontecer, mas tu Joel, tu e ela é que têm a capacidade de fazer a vossa relação durar para toda a vida.

Podes achar-me silly depois disto, mas é assim que sou - alguém que não consegue esconder o que sente e o que pensa e que arca com o peso dessas atitudes ..."

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Pontes

Sou pessoa de fascínios. Pontes são um desses fascínios e algo ao qual não me sei manter indiferente. Suponho que simbolizam uma união, uma forma de chegar a um outro lado que de outra forma só conseguiriamos avistar... As pontes não existem só para serem cruzadas, existem para simbolizar, para contemplar. 

Sei a margem para a qual quero ir,
não sei a margem onde estou,
do lado conhecido olharei para trás
onde estava já não estou
mas pelo menos saberei quem sou,
se disso ainda for capaz.

Dicionário Introspectivo

Um projecto que iniciei e não continuei. O objectivo não era terminar, porque fim não o há, espero. Começou por ser uma ideia de auxílio para alguns que me apontam o dedo na complexidade da minha personalidade. Agora é uma necessidade de me encontrar, se algo ou alguém se sentiu ajudado com o ponto de partida, venho agora cobrar, ajuda-me a encontrar; quem eu sou?!

O título é o ponto de partida para a viagem que antecede uma escrita, é um check in obrigatório, onde conferimos a bagagem e reservamos o direito ao nosso lugar na viagem.

Levava escrito no bilhete: dicionário "Joelês". Antes de pedir o lugar à janela achei que não era nessa viagem que queria embarcar...

A vida é formada por muitos acontecimentos e muitos lugares comuns, lugares comuns que condicionam os acontecimentos, e acontecimentos que se tornam em lugares comuns. Carrego já alguns lugares comuns comigo. Dizem-me não quem eu sou, mas quem eu desejo não esquecer de ser, permitem que permaneça vertical perante os obstáculos que surgem.

Este dicionário/glossário é um puro exercício de egoísmo. Exercício sem fim, tal como um poço sem luz. Lançamos a moeda e alguns segundos depois ouvimos o som desta a beijar a água, mas o fundo esse que travará a moeda e terminará o beijo com um abraço, só imaginando. Assim será feito por partes, ao sabor da memória, sujeito aos caprichos das circunstâncias e mutável como a vida.

Pela lógica irracional da mente:

- "Não sou mercenário, mas também não sou missionário". De uso profissional para exprimir que os bons projectos são essenciais, mas sem € nada feito.

- "Quando nasci trouxe 2 coisas ao mundo: um nome limpo e um par de tomates". Aplicado em várias vertentes mas essencialmente profissionais, para vincar que sou íntegro e disposto a ir às últimas consequências.

- "Só quero o que têm para me dar". De contexto da vida íntima, significa que procuro não criar expectativas mas que estou atento e se me deram verdadeiramente tudo, receberão bem mais.

- "Não tenho uma forma de vida, mas sim uma forma de estar na vida". Aplicação ampla, que representa uma postura idealista e me permite não esquecer dos meus princípios e crenças.

- "Para me sentir pleno preciso de me sentir motivado e estimulado". Aplicado com superiores hierárquicos como forma de "alertar" que preciso de novos projectos (motivação) e de um aumento (estímulos), com relativo sucesso.

- "Não a queres não a estragues". Conselho a amigos que dão excessiva bola a miudas não querendo nada, complicando a vida a quem vem a seguir

- "Elas têm que querer mais do que eu". Filosofia para impedir de ficar do lado de quem sofre.

- "Já alguém dizia: onde se ganha o pão não se come a febra". A tradução aqui é fácil, mais palavras para quê?!

- "Sempre disse o meu avô: Uma dás a todas, duas dás às que tu escolhes, três dás à mulher que escolheres casar". Não segui o conselho, agora é algo que prego aos amigos.

- "Para trabalharmos não temos de ser amigos, mas..." Afirmação proferida a relações mais conflituosas no local de trabalho, para relembrar que embora passemos mais tempo juntos que com família e amigos, as relações profissionais imperam sobre as pessoais entre colegas de trabalho.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

A estátua

Muitas são as formas de comunicação e a forma como optamos fazer passar uma mensagem a alguém. Nos últimos tempos sinto que é na escrita que mais sucesso tenho em assegurar que a mensagem é entregue. Não é da entrega que quero falar, mas sim da recepção e não é de uma escrita qualquer, mas sim da que é manuscrita.

Faz precisamente hoje uma semana que no ritual de lançar chave do carro, telemóveis e o restante conteúdo dos bolsos para o pequeno módulo da entrada, reparo que está algo diferente. Antes de ver o algo diferente leio o bilhete, para que antes de ver o óbvio pudesse saber o que era. Num exercício simples e automático seguro as duas partes na minha mão e estudo o encaixe, sendo fácil perceber uma reparação sem preocupações demais. Esboço um sorriso e penso na aflição despropositada da senhora quando partiu a estátua e na descrição impecável do acontecido. Na indiferença da solução que propõe para o problema, ainda me ocorreu viajar novamente para comprar nova estátua nas Caraíbas, imagino a pessoa em si.

Nunca vi a senhora que me vai limpar a casa e já há algum tempo que superei a invasão de intimidade através dos meus objectos pessoais. O contacto é feito via telefone com o gerente e a chave deixada na caixa de correio. Toda a restante comunicação básica, instruções de limpeza ou pedir detergentes é em recadinhos. Esta senhora sei porém que é brasileira, índia, professora de artes. Pensei logo que deveria ter proposto fazer-me ela um objecto que corrigi-se o "dano" da quebra do significado, pensei...

Uma semana passada, o bilhete está exactamente no mesmo sítio e a estátua não se corrigiu sozinha. Todos os dias entro em casa e antes da rotina de atirar chaves, telemóveis e restante conteúdo, tenho fracções de segundo que me recordo de um significado só meu e por isso agradeço à estátua ter-se posto debaixo do quadro.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Outro tipo de passaporte

Nesta viagem que empreendi e revejo mentalmente, necessitei de um passaporte. Desfolho-o virtualmente e das folhas esbatidas e amarrotadas, surgem-me recordações que seguro como chaves da Caixa de Pandora. A tentação é demasiado grande e num rápido gesto, numa sinapse abro e o conteúdo transborda em mim, num movimento a que nenhuma ínfima porção da minha essência fica indiferente.

A viagem tem o seu carimbo, várias viagens vários carimbos, uns ficam marcados de forma mais distinta, outros menos perceptível. A ordem não obedece à cronologia dos acontecimentos. Errantemente, folha sobre folha encontro uma evidência da minha permanência naquela relação, por vezes fugaz outras mais prolongada, mas sempre a prazo.

Cada pessoa que passou na minha vida tem lá um carimbo. Foi por vezes mais difícil entrar, outras vezes mais dificil sair. Fui revistado, a minha mala/vida remexida. Mas de todas as vezes lá estive, vezes houve que apenas pus um pé fora do aeroporto, outras que tomei o tempo necessário, para sentir um pouco mais.

De relações amorosas falo. Preciso de passaporte porque é como se de um estrangeiro se tratasse no que ao amor se refere. Não sei a língua, não sei os costumes, não sei nada e pouco tento saber, porque o esforço por entender, recordam-me as folhas do passaporte, corresponde a não mais querer viajar.

Locais houve que pensei que ficar seria o meu desígnio. Nesses, por vezes precisei aprender muito para sentir esse amor que derruba as incertezas para lá da curva, as dificuldades após o primeiro obstáculo; outras vezes cheguei e senti: "sim aqui vou ser feliz" e nem ao BES precisei ir, porque todo o crédito que necessitava tinha-o eu, ou assim o julguei.

No oposto, pensei que lá nunca mais; no meio termo houve pessoas que me deixaram um enorme desejo de regressar e melhor conhecer, mas há tantos locais por visitar que seria desalinhamento com o que me faz avançar.
Folha por folha, carimbo após carimbo, o volume do que seguro na mão esquerda torna-se maior do que o da mão direita, sinal que percorro na memória as ultimas folhas. Sinto que preenchi todo o passaporte e pouco espaço sobra para mais uma viagem que seja. Reservo um pequeno espaço para a viagem que me levará à pessoa que se separou de mim quando cá cheguei. Reservo tempo, para Platão predestinar o lugar que poderei chamar lar, cheguei de onde nunca parti porque tudo o resto foi fechar os olhos e suster a respiração. Urge a minha chegada para recomeçar a respirar, a viver...

Passaporte pousado, sinto-me cansado, doem-me os braços de carregar a mala. A fadiga do jet lag instala-se em mim. Chega, chega mesmo, será que chega?! Por ora preciso parar, prostar-me um pouco, sobra pouco espaço para errar e o discernimento ficou para trás, preciso parar e esperar que ele me alcance...

Se as pernas não me levam, as asas o farão!