Mergulhei numa orgia dos sentidos. Volúpia intensa rematada pela pele, pelo olfacto, pelo paladar, pela audição; percepção que escapa aos olhos...
A visão, essa faculdade do ser humano, habituada a ser personagem principal, que nos devia mostrar o mundo como ele é, mas esconde o que se esconde para além do cheiro ensurdecedor prostrado perante os olhos.
Enganei-a, enganei a visão. A receita é intransmissível, não pode ser replicada. Os ingredientes banalizam o resultado. O corpo está exausto, os músculos comprimem num latejar, não de agonia mas de concretização. O coração brada a sua força a cada recanto e a cada célula do meu organismo. Os pulmões dizem presente, fomos capaz de acompanhar... Sucesso individual, transportando o colectivo para excitação plena de equilíbrio. Como sempre falta algo...
Incenso, temperatura, amplitudes, som, velas, água, algodão "sedoso"... Fecham-se os olhos. Mergulhar num emaranhado de sons, cheiros, percepções da pele. Sem esforço o som da respiração progressivamente sobrepõe-se, desencadeando um fluxo de energia que se propraga como um tremor de terra suave mas avassalador. Os dedos dos pés, as pernas, o abdomen, os braços, o pescoço, o rosto, os cabelos. Emergir num espaço intemporal e plasmático. De novo em uníssomo. Transformação de dentro para fora. Venha o universo contido naquelas paredes.
Não há entendimento, não há percepção, o que há é um som que vibra no corpo, odores que abraçam o ar em teu redor, ondulando lentamente em direcção ao nariz; a pele transforma-se numa imensa antena parabólica que capta cada estímulo, cada mudança de temperatura, cada gradiente de pressão. Tudo como uma parte, mas uma parte do todo...
E a visão? A visão está lá mais atenta que nunca, a fazer o papel que realmente é o dela. Lentamente os outros sentidos convidam-na a juntar-se à tela. Abrem os olhos, mas, mas, mas... O que é tudo isto? já cá estava? Nunca vi um vermelho assim; formidável as sombras criadas pelo ondular do fumo da vela, e o brilho da água a correr, mas, mas, mas...
Esteve sempre lá, está sempre lá, só saber como e deixar os sentidos aconchegarem a alma!
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