terça-feira, 28 de outubro de 2014

Medo

Ancestral sofridão e demonstração de fragilidade animal. Medo de tanto, medo de nada, medo de sentir, medo de viver. Porque terá surgido? Como surgiu?

 
Dor, ódio, falta de amor, repúdio, sofrimento, angústia, desilusão, perda, solidão, choro, fragilidade... Tudo pedras arremessadas à fundação do individuo ameaçando-o fazer ruir, numa devassidão que suprime todo o desejo, toda a cor, toda a coragem.
 
 
Tão pouco é preciso fazer para afastar o medo, mas tanto mais o faz regressar. Desequilíbrio de ações que se traduz num absurdo duelo entre o passo em frente e a rendição figurativa à posição fetal.
 
 
Rosto que te toldas perante o medo
É de um abraço que precisas?
Um beijo talvez, ou nada quem sabe
Ofereça o pobre aquilo que não tem
Porque gozas tu coragem o medo?
Tu que estás só, ele que tem tanta companhia
Eu, tu, ele, nós, vós, eles - todos
Todos temos medo de algo, medo de ter medo
É isso o medo - somos nós!


In Letras do Olhar 06 de Junho 2014

domingo, 12 de outubro de 2014

De volta ao refúgio

O ser humano nasce e perante ele se prostra um mundo de possibilidades, de infinitas descobertas. Cresce a aprender, a conhecer, a explorar, desenhando o seu mapa e traçando novas fronteiras. De início usa todos os seus sentidos; os olhos para saber o que pretende alcançar, seduzido por cores, movimentos e formas; os ouvidos para entender entre o indecifrável desejo dos progenitores em comunicar, se se tratam de estímulos para prosseguir ou de alerta; os rudimentos da fala que exteriorizam mais de que vocábulos, mas sons de pura orgânica, anunciando a sua presença; o tato e o nariz, ainda presentes pela boca, pois a criança tudo cheira, tudo toca, levando simplesmente à boca.
 
 
O desejo de refúgio, de segurança é superado pelo desejo da aventura,  da descoberta, do alargar de horizontes. O conforto, a comodidade, a segurança do refúgio está lá, bem presente, sempre de braços abertos.
 
 
Cresce o ser humano e a cada descoberta, a cada traço no mapa exponencia-se a sensação de vazio. Desvanece-se o entusiasmo, surgem as dúvidas... A teimosia de não desistir sempre empurrando em frente, trás a dada altura a consciência da dimensão ridícula que cada um na verdade tem. Escala de tempo e espaço de dimensão reduzida, na vastidão do que há ainda por descobrir.
 
 
Os ouvidos nada parecem escutar, a boca fala da mente em línguas que ninguém parece compreender, o cheiro captado é irreconhecível, os olhos fecham-se pois não querem olhar para lado algum, como que impedindo assim a progressão. As mãos essas, as mais insanas, abrem-se em toda a amplitude, num gesto de generosidade e no rosto procuram tapar boca, olhos, ouvidos e nariz...
 
 
Num rasgo de coragem, olhando em redor procura-se o conforto. Sim ele, onde está? Em mares tenebrosos procura o farol que te encha de calor, de energia, de esperança. Segue-o, ele consegue trazer-te de volta, de regresso ao refúgio...
 
 
Encontrar o equilíbrio entre o conforto e a descoberta é a chave do indomável espírito humano. Os que do conforto prescindem, nada farão com a descoberta. Quem não se liberta do conforto, já mais descobrirá o seu lugar e o sem tempo, embora porém possivelmente mais felizes pois a sua dimensão é a que escolhem ter.
 
 
Sai, aventura-te, descobre, arrisca, vive e sente! Encontra o teu farol, mantenho-o sempre presente, mesmo que te surja pelo canto do olho como uma imagem desvanecida e desfocada. Assim que a dor, o cansaço, a saudade, a tristeza surgirem, vais querer voltar ao refúgio!
 
In Letras do Olhar em 17 de Maio 2014

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Sílabas

Palavra que define o meu estado - sílabas. Palavra que nem o chega a ser, não é mas chama-se. A palavra tem três, e elas as sílabas têm uma. O que contem o quê e quem define quem?
 
Assim sou eu, uma intenção, somatório de despropósitos, definindo-me em fórmulas sem exatidão. Queria ser apenas a sílaba porque gosto, porque soa bem, porque ninguém a define, porque não é nada e traz a liberdade de tudo. Liberdade de imaginar, liberdade de completar, liberdade de recriar. Não quero existir nas fronteiras delineadas da palavra, preciso mais espaço, preciso mais liberdade.
 
Sílabas, que bem me soam, como delas gosto. Sílabas repito uma e outra vez, repito todas as vezes que necessito menos uma, por mais que some um ao infinito. Mas escuto-me e acalmo-me, expando-me, relaxo e abstenho-me da melancolia que se apodera. A melancolia que sempre desejo, mas que a saudade não sinto, quanto por perto não a tenho presente.
 
Entre palavras que mais não são que sílabas traço rudimentos do que apoquenta o âmago e liberto-me no poder que me reencontra caprichosamente...

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Aqui e agora

E aqui estou eu. Aqui neste momento e agora neste sítio.
 
Tanto tempo volvido surjo, sem qualquer estranheza pois a sincronia das sensações espelhadas na rotina a que me obrigo, assim o dita. O tempo é agora e o despertador toca. A dormência de risos sem conteúdo, alegria sem motivo, descontração e euforia apenas ameaçada por uma sensação de estranheza, como brisa fria num dia de calor.
 
Tinha de ser, sinto-me eu, agora e aqui, sim eu... Porra de melancolia porque tardas-te, agora não me sinto tão só. Já não rio, já não me encho de euforia mas encontro-me preenchido com tanto vazio.
 
 
Do you know when you feel overwhelmed with something and simply someone whisper close to you ear?! So, it's really me: the best pessimist walking with happiness.