quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Dia cobardemente perfeito

Eis chegada a hora. Coragem!? Coragem não, cobardia sim... Julgara a coragem mais difícil que a cobardia, quando o oposto se prostra perante mim, numa dor sem refúgio!
 
Preciso, tenho, devo... Não sentir, não ver, não ouvir... Encerro os olhos, tapo os ouvidos, fecho a boca... Não vejo, não ouço, não falo...
 
Nada, mesmo nada, não digo, escuto ou deslumbro o que quer que seja. Vazio, só isso, apenas o que preciso em contra posição ao que desejo. Desconstruo tudo em meu redor e só aí julgo possível, espero possível, desejo possível... Mas o quê?! Eu, o quê sou eu. Chegando o momento de ver, ouvir e falar, se possível estarei lá eu, vendo-me, escutando-me...
 
Dita-me a música: " Que dia perfeito, continua a aguentar-te. Que dia perfeito, os problemas não têm de ir... Fizeste-me esquecer a mim mesmo e pensei que era outra pessoa, alguém bom..." E que sentido faz? Todo, todo o sentido verdadeiramente, pois na preguiça de sentir, deixo-me sentir pelas palavras de outros. Mais fácil, pois no final da música bem o silêncio, no final do livro voltamos a contra capa, na imagem desviamos de olhar, e tudo se desvanece. Então porque por mais tempo que mantenha os olhos cerrados, os ouvidos tapados e a boca fechada, quando os abro volta o que a cobardia deu lugar?! Onde estou eu?
 
És o meu farol e a minha âncora. Orientaste-me na tempestade mas agora prendes-me quando de partir eu tenho. Tão fácil ter coragem, tão fácil comparado com isto. Nem farol nem âncora, tenho de continuar a abraçar a cobardia até que seja tão fácil e aí me saberei corajoso.
 
Mas e agora, qual o meu caminho?! Posso não falar, não ouvir, não sentir, mas penso, penso demasiado. Assim nunca me encontrarei, terei sempre receio da cobardia e continuarei a aguentar mais dias perfeitos como este...


quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

A lágrima hoje

Hoje escrevi assim: "A lágrima que falas, essa lágrima que tantas vezes me falta. A lágrima ausente e que teima em não se precipitar pelo meu rosto abaixo. A lágrima que tudo lava, a única capaz de apagar a tristeza e a solidão, a única que nos compreende e abraça pois é parte de nós e perde-se, sacrificando-se para que saciemos a dor e a ansiedade pela ausência do que me faz sorrir..."
 
Sim essa lágrima; mas de onde surgiu ela e porquê hoje! Como sempre e como quando preciso, pelo percorrer do caminho da memória. Não o virtual que apenas acontece na mente, mas o físico e físico é mesmo o caminho que percorria em infância. Pequeno, quase grande, maior mas ainda não grande. Não grande como julgo me ter tornado quando precisei de regredir ao espaço da memória, para sacrificar a lágrima que me salva de tempos a tempos.
 
Nesse mesmo percurso mas agora não pequeno e a pé, mas grande e de carro, passo (presente e não passado porque ainda lá estou), pelas ruas da minha infância e onde outrora existia liberdade, erguem-se agora portões e muros. Não faz qualquer sentido, porque nos cercamos e isolamos do mundo físico? Será para permitir o despudor da exposição sem limites no mundo virtual?
 
Nunca como agora a liberdade nos foi castrada. Terminaram os espaços abertos, os miúdos a correr para casa no final da escola, sem os progenitores recearam inocência roubada. Onde estão os jogos de futebol que eram interrompidos e os postes das balizas afastados para passarem os carros?!
 
A ânsia de esperar cruzar com alguém conhecido, para que naquele particular dia em que estamos fatigados, nos possa dar boleia, está onde? Saudades essa palavra ímpar, saudades de apanhar boleia de alguém ou a alguém retribuir. De trocar os telefonemas sem sentido para ocupar os trajetos sem fim, por uma conversa real, com alguém real e não com uma voz que parecemos reconhecer mas que chega até nós sem compreendermos.
 
Ontem, já ontem dizia: "nunca me arrependi do passado, mas sempre me arrependo do presente!" Disse ontem para hoje sentir isto. Como todos os nuncas, também este o perco no infortúnio das certezas humanas, perco-o para arrepender apenas de não ter pulado mais muros antes de serem intransponíves; de abrir mais portões enquanto estavam apenas encostados e não fechados a sete cadeados; de dar e receber mais boleias...
 
E hoje a lágrima uma vez mais sacrificou-se. Saí da rua, deixei o passado e volto ao presente para me arrepender, mas sem nuncas...

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Redes sociais vs Eu

No pretexto de estreitarem laços, fundem-nos a todos, reduzindo o individuo ao coletivo numa incessante continuação da adolescência, com marcada procura de afirmação na segurança da igualdade de grupos e maiorias.
 
Era mais fácil antes, era mais fácil ser único antes do flagelo das redes sociais. Num ápice todos desejam sol, todos se lamentam da vida, todos sofrem com a morte de alguém, todos estão tristes ou em estado de euforia. Todos respiram, sentem e são humanos.
 
Mas eu não sou todos, quero julgar sentir, ser, estar de forma única. Desejo olhar para os outros como figurantes neste mundo que julguei criado só para mim.
 
O sol é meu, a agonia da vida só eu sinto, a dor de um ente próximo partir apenas a mim me derruba do pedestal da imortalidade... Que direito têm os outros de procurar "A Minha Vida" na imaterialidade das redes sociais?!
 
Quero fugir, quero escapar-me para um sítio onde seja o Eu só mesmo eu. Quando lá chegar saberei ser único, saberei que não há outros, terei a certeza que não mais sentem, dizem ou desejam o mesmo que eu.
 
E aí? Aí faltará algo, faltaram os figurantes, no meu mundo. Mundo que afinal não existe. Existe pois, ele existe, eu sei que sim... O meu mundo sou eu e existo dentro de mim, pois a cada dia da minha existência construo um pouco mais dele. Chegará o dia que me sentirei finalmente pronto e aí, aí mudar-me-ei definitivamente.
 
Vivo voltado para o meu interior, mas não é o suficiente. Chegará o dia que colocarei a última pedra, encravarei a engrenagem e mais não voltarei. Procurem-me aí nas redes sociais...