Sou assaltado por futilidades, só porque sou feliz.
Percorro o caminho de todos os dias. O dia escurece, deixando de o ser, para ser noite. Avizinho-me da placa que me recorda que passarei numa fronteira invisível e que me obrigará a pagar portagem. Barreira essa que tanto me exaltou num passado recente e agora apenas me origina um encolher de ombros e um breve suspirar. No mesmo horizonte de sempre, o avião prepara aterragem.
A estrada é a mesma, os caminhos cruzam-se em sentidos contrários. A solidão do carro é menor que a do avião. Desejo no entanto lá estar, só desejo lá estar, no avião, não no carro. Vou como não quero, no que não quero, no sentido inverso ao que quero, mas vou e sinto agora que sempre irei...
Prossigo no caminho que agora é meu e vejo as pessoas com que me cruzo. O carro que me ultrapassa, o carro que é ultrapassado. A pessoa sozinha, a pessoa acompanhada. Homens, mulheres, portugueses ou espanhóis. A regressar do trabalho, em trabalho, ou em lazer. Todos eles se cruzam com o destino que é o deles. Não o queria por não ser o meu, mas queria viver em alguns desses destinos, para apagar esta inquietação que sempre me assalta, pois no olhar deles não vejo os aviões, mas a solidão de certo estará lá, só que eles não a vêem. Assim a sombra não vê a forma física que a origina, mas eu vejo a sombra!