terça-feira, 26 de outubro de 2010

Nascente de pensamento

As palavras ecoam na minha mente e rompem as barreiras do simples conceito, para iniciar um pensamento. Tal qual com uma gota se inicia o rio, que por sua vez vai alimentar o oceano, estas palavras singelas têm um efeito avassalador em mim e tomam uma dimensão sem igual.

Palavras feito frases, frases feito ideias, ideias transformadas em pensamentos. Desta vez a nascente surge sem aviso, sem saber de onde, nem como. Simples, tão simples, superando o primeiro ruído da comédia irónica e abstracta, surge um caminho mental que tem de ser percorrido.

O eco da minha mente devolve-me com as distorções da volatibilidade da memória: "Comer e beber, terei muito tempo para não o fazer mais!" Simples tão simples, numa concepção de fragilidade humana face à efemeridade da nossa existência, mas assente na lógica do presente.

Vejo esta figura no espelho. Curiosas as rugas, curiosos os primeiros pelos brancos no peito e na barba, curioso o baço do olhar. Meu tudo meu e no entanto como cheguei aqui? Quem sou eu e quantas refeições saltei? Sempre a assombração das incertezas, da dúvida do trilho percorrido, sempre o olhar para trás e nunca em frente, sempre...

O espelho já não consegue mostrar quem eu fui, mas a imagem do que serei é nítida. Quem eu sou apenas um apeadeiro sem importância nesta viagem. Quando perante ele me colocar e os socalcos das rugas transmitirem o agreste da vida, quando não restar um só cabelo escuro, quero que me mostre um brilho enorme nos olhos, podendo aí dizer: agora não preciso comer, não preciso beber, mais fome e sede não terei, estou pronto...

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Profecia

A criança que fui, o adulto que serei, e agora o que sou? No passado vejo-a, ainda a ouço. Pelas palavras não ouvidas, pelos gestos não vistos, ela disse-me e eu percebi. O que percebi é que um final me esperava, um final do qual não fugirei, mas que não devo procurar.

Assusta-me esse final, já me atormentou agora só me assusta. Resolvo retirar os espinhos que me flagelam e não é sem receio que espero esse futuro, desejando contudo que o futuro nunca venha a ser presente. No passado me ecoa a profecia, no presente esforço por eliminar a angústia.

Resolvo viver com os meus fantasmas. Pergunto-lhes muitas vezes, talvez não saiba ouvir a resposta, até saber perguntarei sempre: o que me é reservado? A pergunta soa-me sempre a deja vu, e ocorre-me outro olival e uma energia sem ímpar: "Pai, se quiseres, afasta de Mim este cálice, não se faça, contudo, a minha vontade mas a tua".

Não estou preparado mas estarei...